A SCANNER DARKLY

scannerdarkly

O filme O Homem duplo (A Scanner Darkly) é a mais nova empreitada do diretor Richard Linklater, o mesmo gênio que fez Waking Life (que EU considero um dos melhores filmes de todos os tempos) e Antes do amanhecer. Baseado na obra de Philip K. Dick (o cara que deu origem, com seus contos, a filmes como Blade Runner e Minority Report), o filme se passa num futuro (“7 anos a partir de agora”) onde todos são constantemente monitorados (escaneados) e a única maneira de permanecer anônimo é usando um traje que combina pedaços de 1.500 pessoas aleatoriamente, a todo segundo (um efeito fantástico que chega a lhe desorientar). Os EUA perderam a luta contra as drogas, em especial uma chamada Substância D, altamente viciante e com efeitos destrutivos para o cérebro.

Dois terços do filme são totalmente histrônicos. Atuação exagerada (mas deliciosa), muito, mas muito papo de drogados (algo como um Antes do amanhecer com diálogo sem pé nem cabeça). Fiquei meio perturbado com isso no começo, mas lá pela metade eu relaxei e estava me divertindo horrores com o “Big Brother dos drogados”, e confesso que, com o fim do filme, fiquei com saudades das maluquices divertidíssimas dos atores secundários (interpretados por Robert Downey Jr., Woody Harrelson e Rory Cochrane).

Se você ainda não viu o filme, não ouse ultrapassar esta linha (onde reside os melhores comentários, então corra já pra assistir e depois volte aqui)

ZONA DE SPOILEEEEERSSSSSSS!!!

O mais fantástico do filme é que ele é uma crítica às drogas sem ser uma crítica direta às drogas ou aos usuários. O próprio K. Dick fala nas notas finais do livro (veja a versão completa) que vê essas coisas como uma questão de causa e efeito: você as usa, elas te matam. Natural e imparcial. São justamente trechos dessas notas que causam o maior impacto do filme, no final, quando diz “Esta foi a história de pessoas que foram punidas por tudo o que elas fizeram.” E sai enumerando os amigos que morreram ou tiveram danos cerebrais permanentes por causa das drogas. E termina: “Eles permanecem em minha mente, e o inimigo nunca será perdoado. O “inimigo” foi seu erro ao brincar. Deixe-os brincar novamente, de alguma outra forma, e deixe eles serem felizes“. O próprio K. Dick foi um dos que “brincaram”, e ele se define não só como um dos personagens, mas como a própria história em si.

Interessante a dimensão que o roteiro ganha no final, quando percebemos que a própria “indústria da recuperação” do governo é quem trabalha na produção da droga. Um ciclo vicioso, onde o poder dado ao governo só existe por conta do que ele tem de combater. Uma vez combatido, haverá um esvaziamento de poder, então ele é artificialmente alimentado por quem não quer largar o osso!! Alguma relação com George Bush e o “Ato patriótico” pós 11 de setembro? TODA. Tanto que Alex Jones – uma das únicas vozes dos EUA que se levantou contra a farsa do 11 de setembro – faz uma ponta no filme como o cara do megafone que protesta contra a falta de liberdade e é “silenciado” pela polícia (repetindo o papel dele em Waking Life).

Mas o creme de la creme foi mesmo uma passagem que, de tão banal num filme cheio de diálogos malucos, me passou quase despercebida no cinema. Eu li, e só depois pensei: eu li mesmo o que eu acho que li? Mostrava Keanu e outros pacientes com problemas no cérebros, meio zumbis, e a cafeteira (ela mesma) dizia:

“As coisas vivas e as não-vivas estão sempre trocando características. A vontade das coisas não-vivas é mais forte do que as vivas. Os vivos não deveriam nunca serem usados para servir aos propósitos dos mortos. Mas os mortos deveriam, se possível, servir aos propósitos dos vivos”

Sacaram? Não? Então leiam o post Satanismo, onde falo das influências dos desencarnados sobre os “playmobils”, seus bonequinhos de carne, que servem pra continuar sentindo o prazer das “viagens” e depois descartá-los na sarjeta quando seus corpos não funcionam mais direito. Vindo do cara que fez Waking Life, pode apostar que esta fala não está aí por acidente. E creio também que Robert Downey Jr. e Winona Ryder (excelentes atores que tiveram suas vidas e carreiras prejudicadas pelas drogas) não foram escalados pra esse filme por acaso.

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Bruno/
Bruno/
18 março de 2007 2:46 am

ADORO as obras de Phillip K. Dick!

O kra é simplesmente um gênio!

Adoro a forma como ele forma suas opiniões em cima de conceitos básicos da sociedade, fazendo crer que as pessoas são puramente reflexos de seus próprios pensamentos!

ops… to viajando demais de novo ne?

É esse maldito óregano que meu tio deixou aqui em casa! Sempre que provo um pouco eu fico, sei lá, meio doidão…

😛

Bono
Bono
21 março de 2007 6:29 pm

Agente pode até tentar, mas ninguém é totalmente consciente 100% do tempo.

Lionheart
Lionheart
21 março de 2007 8:57 pm

Acid, sinceramente, ser ator e ter uma vida normal??? Ainda mais se for de Hollywood… Pois a graça de ser ator é justamente “la vida loca”. Muitos negam, é claro, mas só fazem isso pra chamar atenção. Ator é egocêntrico por natureza.

Lionheart
Lionheart
21 março de 2007 8:58 pm

Ah, by the way, é SIM um pacto como diabo…

Bruno/
Bruno/
21 março de 2007 9:32 pm

MUAHAHAHAHAHA!

😈

será que esse pacto é feito somente entre atores ou produtores, diretores e roteiristas tbm?

talvez né, Hollywood sempre teve seu lado diabólico, especialmente Tinseltown, que é o museu dos horrores do ramo. Atualmente em exibição: Michael Jackson deseja reunir os Jackson 5 (?)…

😛

Pax!

x-builder
x-builder
21 março de 2007 9:38 pm

Vi este filme, e nao me acrestou muito. Talvez por nao me interessar muito por este tema.

Talvez goste mais de walking life…que tem uma tema mais interesante para mim: existencialismo.

billy shears
billy shears
21 março de 2007 9:48 pm

Não concordo com o seu ato tresloucado e acho q ele tem informação suficiente pra não se deixar levar pelo lado negro da força. Pois deve ter pesquisado e lido bastante para compor seus personagens, principalmente: Buda e Neo.

Mas creio q o Bono explicou de maneira sintética e apropriada este ato: ” Agente pode até tentar, mas ninguém é totalmente consciente 100% do tempo”.

Joey Castle
Joey Castle
24 março de 2007 12:24 am

Putz! Várias coisas legais a respeito do filme para se discutir e o pessoal vem com picuinhas…

Paulo Junior
Paulo Junior
30 março de 2007 11:32 pm

Essa última frase também pode ser interpretada levando em consideração a relação que nós temos com os bens materiais. Pois na sociedade massificada na qual vivemos hoje somos muitas vezes escravos do consumo. Ficamos hipnotizados e agimos por impulso, instinto, comprando coisas que muitas vezes não são úteis, que após algumas semanas ficarão abandonadas em algum canto. Ou seja, os bens materias devem nos servir, e não o contrário! S.M.J. Abraço a todos!

Isaias Malta
Isaias Malta
11 abril de 2007 9:25 pm

Fui atrás do “Walking Life” graças a dica deste blog, agora estou para conseguir este Scanner Darkly,
Fiz um comentário sobre o excelente Nirvana no meu Blog http://pireu.blogspot.com seção filmes, vale a pena dar uma conferida no filme, um puro Cyberpunk.

Antonio Mesquita
Antonio Mesquita
12 abril de 2007 12:54 am

Será que vc não esta enganado com sua hermeneutica, pois no livro de Samuel Deus se inflama contra o povo e faz com que Davi tenha colera contra o povo e adverte a ele não fazer o recenseamento, mas em Cronicas satanas se levanta contra o povo e excitou David a fazer o recenseamento de Israel. Peço que os senhores tenha muito cuidado no tange a Deus, pois pode ser um trágico caminho sem volta, porque Deus também é fogo consumidor. II livro de Samuel em seu capítulo 24:1, você lê com relação ao recenseamento de Israel o seguinte: “A… Read more »

Marcelo Alvares
Marcelo Alvares
21 setembro de 2007 5:58 pm

Cara! MUITO OBRIGADO! Eu procurei MUITO a versão completa do fim do filme e só achei contigo.
Aquele fim de filme foi a chave de ouro de uma experiência que me fez sair bem diferente do que entrei.
Abs,

billy shears
billy shears
29 dezembro de 2007 5:36 pm

A msg mais importante que apreendi deste filme e creio que tb está no livro é que não importa o qto tenhamos mudado em função de acontecimentos, drogas, perdas, etc… dentro de nós ainda habita a mesma pessoa que fomos no passado e um dia ela se manifestará e trará à tona o que nós somos na nossa essência. Ainda que tenhamos nos perdido em função da influência do mundo externo. A guerra de hemisférios do filme, pode ser a guerra dos eus. No fim vc decide qual eu irá vencer, através de suas escolhas. Bela homenagem do autor a… Read more »

nabusca
nabusca
16 janeiro de 2008 11:42 pm

Substancia D, alguma ligação com LSD ? ……
Sei que eles falam de muitas drogas baixas como cocaína, metaanfetamina, mas em comparação com a realidade, que Substancia D seria essa???
Beleza sabermos que os amigos do cara se afundaram, a maioria morreu, mas na vida real, que drogas são essas???

abraço

Leandro
Leandro
9 agosto de 2009 9:56 pm

Ótimo post!

Saindo da Matrix
Saindo da Matrix
21 março de 2007 6:03 pm

O que me impressiona é a justiça defender esse tipo de “profissão” como “liberdade de impresa”. E a liberdade que termina onde começa a de outrem? Gostaria que um juiz tivesse suas fotos na capa em poses desconcertantes, fazendo careta, botando o dedo no nariz, “largando um barro”, etc, pra ver se a justiça continuaria tão impassível assim diante dos paparazzi. Outro dia fotografaram Brad Pitt andando pelado dentro da própria casa (ou hotel) e botaram nas capas das revistas. Será que o cidadão que paga seus impostos não pode ter direito à liberdade dentro da própria casa sem estar… Read more »

Mcnaught
Mcnaught
21 março de 2007 4:39 pm

Fotógrafo brasileiro Roberto Maciel, apanhou de Britney Spears certo dia. Um vídeo mostrou o ataque de Britney Spears e seu guarda-chuva verde. Seriam os brasileiros os “chatos de plantão´´ ??? Nesse país, onde o povo presta mais atenção aos programas de fofocas, revistas desse ramo, etc… O que esperar? A invasão de privacidade rende milhões. Estaríamos nós criando profissionais da inconveniência? Sim, existe coisa relacionada a fofoca no mundo todo. Só que, essa de invadir a privacidade, já causou morte e muita intriga. Mas agora, vejam só que, derepente, o brasileiro pode ser o melhor nisso. Um Camera da globo… Read more »

Eduardo
Eduardo
18 março de 2007 10:10 am

É o foda vai ser arranjar esse filme aqui na minha cidade, nem waking life têm.
Mas de boa vou dar um jeito
valeu pela dica
t+

Paulinha
Paulinha
18 março de 2007 11:09 am

Excelente o post!!!Detalhes que eu nem me toquei.

Muito inteligente esse filme( e você postou primeiro que eu..hihi)
Bjux!;*

Lionheart
Lionheart
18 março de 2007 12:16 pm

Ainda não vi, mas espero que tenha, pelo menos, uma estória servindo de fio condutor para a loucura toda… Até gosto de filmes com diálogos, mas a coisa toda TEM que ter uma estória base, ou mesmo muitas, para amarrar tudo. Senão corre o risco de ficar extremamente chato, como Waking Life por exemplo…
Que me perdoem os fãs e os que têm vontade de assistir, mas eu tenho que dizer: Waking Life chega a DOER de tão chato…
Ah sim, até tem umas idéias interessantes jogadas aqui e ali, mas que é chato, isso é!

Leandro Costa
Leandro Costa
18 março de 2007 1:20 pm

Além da crítica às drogas, o filme é também uma crítica à repressão às drogas. “I’ve got a block against this stuff,” Arctor said. (…) “Do you know why I’ve got a block against this stuff?” Arctor said. “Because this is what gets people on dope.” He thought, This is why you lurch off and become a doper, this sort of stuff. This is why you give up and leave. In disgust.” E mais além… a base do iceberg… “D,” he said aloud to his audience, “is for Substance D. Which is for Dumbness and Despair and Desertion… the desertion… Read more »

Joey Castle
Joey Castle
18 março de 2007 9:26 pm

A cafeteira dizia é boa!! Você provavelmente devia estar sob efeito de algum tipo de substância. São diálogos de três pessoas: Homem Magro: As coisas vivas e as não-vivas estão sempre trocando características. Mulher: A vontade das coisas não-vivas é mais forte do que as vivas. Careca: Os vivos não deveriam nunca serem usados para servir aos propósitos dos mortos. Mas os mortos deveriam, se possível, servir aos propósitos dos vivos. Embora eu não veja problemas em interpretar o dialogo desse modo, no livro existe um sentido, ou melhor, um propósito nesse dialogo que não é exatamente esse. Linklater fez… Read more »

Cris
Cris
19 março de 2007 8:43 am

Brincar é muito inocente. O inimigo foi se erro ao jogar. Não existe inocência completa no uso de drogas.

mario
mario
20 março de 2007 11:40 am

já usei alguns tipos de drogas e, observando-me e aos outros cheguei a conclusão que damos um mergulho de cabeça na inconsciência ,acreditamos tão piamente no que estamos vivendo, naquele prazer evanescente ,que nos parece experimentar algum nível elevado de consciência, que não é nada mais que uma identificação profunda com aquele estado. É como se estivéssemos mortos e rejubilando-se por isso….digo isso por comparação pois ,sob alguns métodos, já experimentei alguns estados reais de simples ESTAR ,de não querer ser isto ou aquilo ,de não estar nem lá em acolá, de não estar identificado com nada, de simplesmente dizer… Read more »

Olim
Olim
20 março de 2007 12:01 pm

Seria bom demais estarmos com os dois pés no alto ou, pelo menos, um pé na terra e outro no alto ou, ainda assim, os dois pés sobre a terra.

O chato seria não ter os pés ou ao menos tê-los sem poder apoiá-los, a não ser com a nossa imaginação induzida – e como isso é fácil!-.

🙂

Loko
Loko
20 março de 2007 3:27 pm

Ae acid…nada a ver com o post…só gostaria de saber se vc connhece um livro q se chama: Li Ki (the book of rites)….

<< Resp: nope >>

desculpe…caso não tenha visto…de uma lida nisso…apesar do meu tosko ingles achei muito interessante:

http://www.sacred-texts.com/cfu/liki2/liki217.htm

Padawan
Padawan
20 março de 2007 11:18 pm

Posts como este não rendem comentários. =P

billy shears
billy shears
21 março de 2007 3:25 pm

Acabei de ler q o keanu reeves foi preso por jogar o carro em cima de um brasileiro q o fotografava, acertando-lhe no joelho. Após dar um cavalo de pau, para ir aonde estava o fotógrafo. Não vou entrar no mérito se o cara estava sendo inconveniente ou não, ao tirar a foto, a questão é: O q leva um ator de primeiro nível q protagonizou um denso personagem de uma obra prima das telas como MATRIX, a ser tão desiquilibrado desse jeito? Este filme contém tantos ensinamentos, mas o principal ator não é capaz de enxergá-los? Detalhe: ele estava… Read more »

Olim
Olim
21 março de 2007 3:31 pm

Ora, billy shears , está explicado: ele, por ser ator, só representou um papel, coisa que fazemos com maestria a cada instante de nossas vidas.

Saindo da Matrix
Saindo da Matrix
21 março de 2007 3:42 pm

Mais um motivo pra Keanu estar nesse filme, ao lado de Downey e Winona. (por mim ele teria carta branca pra passar por cima do fotógrafo. Ô “profissão” incoveniente! Devia ser proibido por lei invadir a vida cotidiana sistematicamente de uma pessoa, POR MAIS que ela seja uma pessoa pública. Quer dizer que eu não tenho o direito de ser ator e ter uma vida normal? Por acaso é um pacto com o diabo que se faz? Sinceramente…)

Paulinha
Paulinha
21 março de 2007 4:04 pm

Mas imagine a gente respondendo ao que não gostamos dessa maneira com os outros?
Acho interessante as pessoas tentarem todos os dias se superarem, seguir o fluxo só quando estão fazendo bem a si e ao proximo.

Anônimo
Anônimo
13 novembro de 2014 12:29 am

Filme: O Mensageiro Sinopse: O jornalista Gary Webb (Jeremy Renner) é alvo de uma intensa campanha de difamação após denunciar o envolvimento da CIA com os rebeldes Contras da Nicarágua e o tráfico de cocaína. Baseado em fatos reais! Título original: Kill The Messenger Lançamento: 16 de outubro de 2014 Dirigido por: Michael Cuesta Com: Jeremy Renner, Mary Elizabeth Winstead, Michael Sheen Gênero: Suspense , Drama , Biografia Nacionalidade: EUA   Curiosidades sobre O Mensageiro: Vários membros do elenco e da equipe admitiram receber um “empurrão” a nível governamental para o filme, tanto durante as filmagens quanto na pós-produção. Divisões… Read more »

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