Ainda em 1991, ano em que se consagrou com Streets of Rage, Yuzo fez a música de abertura do 1º festival de arte Sharp X68000 (um evento nacional do Japão que consagra os melhores trabalhos feitos neste computador). A música segue o mesmo estilo House do jogo de luta, e é uma das minhas preferidas:
Em 1992, Yuzo mostrou-se em plena forma com o game para SNES Super Adventure Island, da Hudson Soft, e nele Yuzo conseguiu outro feito inédito para compositores: o de poder ostentar seu nome no adesivo do cartucho japonês, além de na própria caixa do jogo, acima do nome do famoso (no Japão) artista Susumu Matsushita, que desenhou a arte da caixa.
Nesse jogo ele esbanjou versatilidade, enveredando por ritmos até então não utilizados no mundo dos games, como o Samba, Calypso, Ska e Reggae:
O ÁPICE DO SUCESSO
Yuzo sempre deixou sua marca em grandes jogos, mas vai sempre ser lembrado por UM jogo, justamente o auge da sua carreira, onde foi aclamado unânima e mundialmente: Streets of Rage 2.
“Streets of Rage 2 é meu trabalho mais poderoso e meu jogo preferido”
Yuzo Koshiro
Com o sucesso de Streets of Rage 1, o jogo virou o carro-chefe da Sega para adolescentes e adultos (enquanto Sonic era o mascote da gurizada). Para a continuação, lançada no final de 1992, a Sega não economizou: com mais memória no cartucho, a equipe (a recém criada Ancient, liderada por Ayano Koshiro, mais a M.N.M Software, com quem Yuzo trabalhou no passado) pôde criar um jogo cuja jogabilidade é perfeita, os personagens são grandes, bem animados, com vários níveis e ótimos gráficos. O som, então, nem se fala. A técnica de Yuzo de usar samples no canal de som PCM do Mega Drive foi usada ao extremo, desta vez em parceria com o compositor Motohiro Kawashima.
“Eu ia a muitos clubes na época e ouvia muita música dance. Essa deve ter sido a razão de minha música nessa época ter sido neste estilo. Soul2Soul, BlackBox, Maxi Priest e Caron Wheeler eram os meus favoritos”
Yuzo Koshiro
Certamente Yuzo “chupou” muito dessas bandas na hora de compor, mas a cópia mais descarada foi na música “Under logic“, que é quase um remix de “Move any mountain“, do grupo The Shamen. Isso, entretanto, não tira os méritos do compositor, que provou (e ainda prova) seu talento nos mais diversos estilos. A idéia era mesmo emular em FM os sons que eles ouviam nos clubes, em especial as batidas do Roland TR-808 e TR-909, e os sintetizadores Roland TB-303.
MOTOHIRO KAWASHIMA
Ao falar sobre Streets of Rage 2 é preciso mencionar a parceria com Motohiro Kawashima, com quem Yuzo divide a trilha sonora. Motohiro foi o primeiro contratado “oficial” da Ancient, já que lá já havia Ayano, Yuzo e um programador herdado de outros jogos. Ele conta que tudo começou na escola de música, onde “um cara que fazia música eletrônica estava contratando pessoas pra sua recém criada empresa”, e uma das vagas era de músico (Yuzo fez isso pra poder se livrar do excesso de trabalho, já que ele agora acumularia o cargo de diretor da Ancient com a de músico). Aí então mandou uma fita demo e Yuzo gostou do que ouviu. Os dois ficaram amigos na hora e foi Motohiro que levou Yuzo para os clubes mais underground de Tóquio ouvir as músicas que inspirariam Streets of Rage 2, que no caso de Motohiro foram o Trance Alemão e o Techno de Detroit.
O primeiro trabalho de Motohiro foi Shinobi II: The Silent Fury, em 1992, e depois Batman Returns, ambos para Game Gear. Para Streets of Rage 2 Motohiro foi chamado por Yuzo quando ele já tinha feito metade do trabalho, e Motohiro fala que muito do que ele fez o Yuzo teve de “consertar” depois, pois ele ainda estava pegando o jeito. A coisa mudou quando ele compôs Expander, e Yuzo exclamou “Isso é fantástico!”. O resultado é que, enquanto Yuzo fazia as músicas mais para o melódico e Soul, Kawashima puxava as suas para um techno frenético. No final das contas, essa parceria acabou tornando a trilha de Streets of Rage 2 mais forte, com uma personalidade jamais vista em videogames.
Em 1993, a M.N.M Software chamou Yuzo para fazer uma trilha sonora especial para o remake do jogo de tiro Slap Fight, também pro Mega Drive. O jogo traz a trilha original (de 1986), uma arranjada e a de Yuzo, e você pode selecionar qual você quer ouvir enquanto joga:
VOLTA AO CLÁSSICO
A música dance foi aos poucos cedendo espaço no CD-Player de Yuzo para o clássico: “Meu compositor favorito é Anton Bruckner, que eu adoro pela pureza de suas melodias“, disse certa vez. O sinal dessa mudança foi o jogo Actraiser 2 (1993) que, ao contrário do seu antecessor, não mais funde música clássica com batida eletrônica: é puramente orquestral.
Esta é uma trilha sonora que você precisa ter uma certa bagagem musical para apreciá-la em sua totalidade. Lembro que no começo estranhei e não gostei, achei chata, mas era a época em que comecei a ouvir música clássica, e fui começando com Wagner, Bach, Mozart, e quanto mais eu escutava, mais eu apurei meu ouvido pra beleza dos arranjos e, a cada vez que revisitava a trilha de Actraiser 2, mais eu gostava de alguma música que até então eu desprezava. Hoje mesmo eu estava re-escutando-a para publicar aqui e pensando no quanto ela é complexa e avançada pra sua época!
DECLÍNIO
O “reinado” de Yuzo Koshiro na game music durou até a chegada dos videogames em CD. Estamos em 1994: o Sega CD e 3DO foram lançados nos anos anteriores, mas não vingaram. SNES e Mega Drive estavam dando seus últimos suspiros, e no fim do ano viria o Playstation mudar TUDO no mundo dos games. Streets of rage 3 é lançado em junho e marca o que seria o início do declínio de um gênio: um trabalho puramente experimental com o compositor Motohiro Kawashima que gerou reações divididas entre os fãs: parte amou, parte detestou. No Japão a recepção foi boa, mas no ocidente a maioria não gostou, inclusive eu! Isso porque os sons que até então eram melódicos (mesmo que nos mais diversos estilos) foram substituídos por cacofonias sonoras que emulavam o gênero Industrial.
Para conseguir esse tipo de som, Yuzo Koshiro desenvolveu um software pra criar os sons. Ou seja: mais da metade das música havia sido composta por computador, pelo computador. O software criava variações a partir de certas batidas e samples, e tudo o que o compositor precisava fazer era escolher as melhores sequências e juntar tudo numa “música”:
Durante décadas achei que a “culpa” pelo estilo da música de Streets of Rage 3 era do Motohiro, mas nesta entrevista ele fala que começou os trabalhos com o mesmo estilo de música do 2, mas foi Yuzo que incentivou ele a usar o tal programa e a criar músicas cada vez mais loucas. De fato, as músicas mais “normais” (melódicas), como a Moon, foram feitas pelo Motohiro.
Yuzo também usou esse sistema em outros jogos, desta vez em estilo clássico, para Eye of Beholder (Um obscuro jogo pra Sega CD que pouquíssima gente no mundo sabe que ele compôs) e Beyond Oasis, o primeiro jogo que Yuzo dirigiu, além de compor. São trilhas que primam por criar um ambiente, um “clima”, mas sem inspiração musical. Pra mim, são só trilhas sonoras sem personalidade, como as de um filme chato:
A partir dessa época Yuzo não mais conseguiu superar as expectativas, lançando trabalhos de menor projeção e se dedicando mais e mais a produção de seus próprios jogos na Ancient, junto a sua irmã Ayano.

Referência:
Entrevista com Yuzo Koshiro para a Red Bull academy (2004);
Entrevista com Ayano Koshiro sobre Streets of Rage 2;
Polygon – Entrevista com Yuzo Koshiro sobre a Ancient;
SEGA Forever meets… Yuzo Koshiro (Entrevista sobre a série Streets of Rage, em inglês);
Conheça o estúdio de Yuzo Koshiro e veja os vídeos da sequência (cancelada) de Streets of Rage;
Entrevista para a revista Electronic Gaming Monthly sobre Actraiser 2;
Entrevista que fiz em 1998 com Motohiro Kawashima
Continuação:
Parte 6: A volta por cima (em breve)