Continuando nossa história da gamemusic, vamos conhecer a geração 8-bit e os melhores compositores desta Era.
NINTENDO ENTERTAINMENT SYSTEM (NES)
Em 1983 a Nintendo lança seu console mais famoso, o Famicom (de Family Computer, mas que só ficou popular dois anos depois, ao ser lançado no mundo com a sigla NES, de Nintendo Entertainment System), com quatro canais de síntese e um D-PCM, que reproduz samples. Neste link tem um pouco mais sobre as capacidades sonoras do Nintendinho.
O engenheiro de som Yukio Kaneoka desenhou o chip de som do NES e foi o pioneiro nas músicas do console, compondo músicas para Mario Bros. (não confundir com o Super Mario Bros, que veio 2 anos depois), Popeye e, mais conhecido para a geração 16-bit (por conta de Donkey Kong Country), o tema principal de Donkey Kong:
Yukio definiu o estilo de som Nintendo, e foi o mentor dos dois principais (e mais famosos) compositores da Nintendo: Hirokazu Tanaka e Koji Kondo.
Em 1985, o jogo Super Mario Bros estabeleceu um marco na história dos videogames: teve a primeira trilha sonora criada especificamente por um compositor profissional, Koji Kondo, que também fez a memorável trilha épica de Legend of Zelda (1986). Kondo é uma lenda viva do mundo da gamemusic, sendo o pai da trilha mais conhecida do personagem mais conhecido por todos:
Alguns outros compositores fizeram estréia no NES e se destacaram publicamente entre os gamers, como Koichi Sugiyama (Dragon Quest), Hirokazu Tanaka (Metroid e Kid Icarus), Kinuyo Yamashita (Castlevania) e provavelmente o mais famoso de todos os compositores de videogame, Nobuo Uematsu (Final Fantasy, mas vamos falar dele só no próximo capítulo).
Sega SG-1000
Também em 1983 foi lançado no mercado oriental um obscuro videogame que se seria o primeiro de muitos da empresa Sega, o SG-1000. Sua recepção tímida obrigou a Sega a testar novas versões desse hardware, e assim, em 1984, a Sega lançou o SG-1000 II, com mais recursos e com um acessório (teclado) que transformava o console num computador doméstico intitulado SC-3000. As empresas japonesas estavam testando vender seus produtos como computadores domésticos, pra se afastar da má fama dos videogames, conseguida pela crise dos jogos eletrônicos ainda em 83. Por falar em computador, neste mesmo ano aparece no Japão o MSX, um computador pessoal que fez muito sucesso no oriente e nos EUA, e que possui até hoje uma comunidade apaixonada, especialmente no Brasil, tendo sido este o primeiro computador de muita gente na casa dos 30 anos. Curiosamente, ele tinha a mesma CPU e chip de vídeo dos videogames Colecovision e o Sega SG-1000, e o chip de som era similar, um General Instrument AY-3-8910 (PSG) com 3 canais de som e um de ruído (noise). Os melhores jogos de MSX vieram da empresa Konami, que usava o mesmo chip de som nos arcades.
O ano de 1985 trouxe o SG-1000 Mark III, da SEGA, que é praticamente o que viríamos a conhecer no Brasil como Master System, só que sem o chip de som FM (que era um opcional).
PC88
Aparece também em 1985 no Japão a evolução do computador pessoal, o PC-8801 que, embora tenha surgido em 1979, só ganhou uma placa de som neste ano, com a série PC-8001mkIISR. Foi aí então que toda uma geração de (então) jovens entusiastas da música (que hoje são grandes nomes, como Yuzo Koshiro) puderam dar vazão ao seu talento, aprendendo a programar músicas em casa e distribuindo-as em revistas especializadas. O PC88, como é carinhosamente chamado, possui um processador de som Yamaha YM-2203, de 8-bit, com 3 canais de som FM (OPN), 3 canais PSG (SSG) e 1 para ruído. No próximo artigo falaremos mais dele.
AMIGA
Também em 1985 surge um novo computador pessoal (e também “marqueteado” como plataforma de games), desta vez no outro lado do mundo, nos EUA, que é o Amiga. Na verdade ele foi desenvolvido em 1982, mas só chegou ao mercado 3 anos depois, quando foi comprado pela empresa Commodore International e vendido como o sucessor do Commodore 64 (o C64, de quem eu falei na primeira parte dessa série). O chip de som do Amiga, apelidado de “Paula“, suportava 4 canais de som estéreo (2 na esquerda e 2 na direita) com resolução 8-bit PCM e frequências de 20 a 29hz. Com um truque de software, ele podia ampliar sua capacidade para 8 canais! Era muito, mas MUITO avançado pra sua época, tanto é que permaneceu o mesmo nas subsequentes versões do computador Amiga até 1996 (mais de 10 anos depois!). Pra dar uma idéia do poder desta máquina, vou usar como exemplo um dos maiores injustiçados por não estar na Hall of Fame do mundo da gamemusic: Barry Leitch. Até escrever este artigo eu não sabia que ele era o cara por trás da trilha sonora mais adrenalina dos games: Top Gear. Isso mesmo! Eu vou dar um salto cronológico aqui pra mostrar uma música que utiliza todo o poder do chip Paula, no jogo de corrida, Lotus Turbo Challenge 2. (Curiosidade: Uma das músicas deste jogo acabou sendo usada na trilha de abertura de Top Gear, para SNES, um ano depois):
Em 1986 a Sega lança oficialmente o Master System pra competir com a Nintendo nos videogames 8-bit, mas esse console nunca foi realmente um sucesso nos mercados norte-americano e japonês. O fato é que, beneficiado com 2 anos de avanço da tecnologia, o Master System era superior ao NES, tanto nos gráficos quanto no som. O chip era um clone do SN76489, da Texas Instrument, e proporcionava 3 geradores de ondas quadradas mono no formato PSG – que tinha a característica de soar muito vibrante (e muito metálico) aos ouvidos – e 1 gerador de ruído. Também dispunha de um chip Yamaha YM2413 com 9 canais FM (mono). Mas seu problema é que ele foi lançado muito tempo depois do NES, que já tinha uma base sólida de consumidores e contratos de exclusividade com várias empresas produtoras de jogos. Também tinha o problema de não contar com um “sequencer” (programa que faz a música diretamente pra máquina, como um MIDI). Katsuhiro Hayashi lembra o quanto era difícil: “Fazia a música num Yamaha DX7 e pensávamos numa melodia, uma base, uma bateria e uma virada. Depois programávamos tudo em assembly (linguagem de alto nível de máquina) no chip Z80.”
Ainda assim, vários jogos do Master System com suas músicas maravilhosas ficaram na memória dos (poucos) que jogaram:
ARCADE
Apesar de existir desde os anos 70 nos arcades, foi a partir de 1985 que a SEGA criou seus jogos mais clássicos, que faziam uso de uma tecnologia revolucionária que possibilitava gráficos pseudo-3D. O primeiro foi Space Harrier (1985), seguido por Fantasy Zone (1986) e pelo inesquecível Out Run (1986), um jogo de corrida diferente de todos os outros, com uma trilha sonora agradabilísima, que até hoje remete ao prazer de dirigir a céu aberto. Em 1987 chega After Burner, com um som de guitarra inspirado no sucessos do filme Top Gun. Em todos esses jogos, a música é fruto do talento de Hiroshi Kawaguchi, e são lembradas até hoje como parte do legado da SEGA para a música de videogame. Nesses Arcades a parte sonora era composta de um chip Yamaha (YM2151 ou YM2203) mais um chip SegaPCM para samples (menos no caso de Fantasy Zone).
Uma grande influência na música dos games também veio dos Arcades, através de Miki Higashino no jogo Gradius, com um estilo de som que NUNCA, até hoje, deixou de ser associado a essa série:
Um outro tema clássico da gamemusic também surgiu nos Arcades nesse mesmo ano de 85: Ghosts’N Goblins. Essa música vai, obrigatoriamente, ser tocada no primeiro estágio de TODAS as sequências dessa série (conhecida depois por Ghouls and Ghosts):
Em 1986 a empresa SNK, que viria no futuro a ser conhecida pelo Neo Geo e seus jogos de luta, foi a primeira a lançar uma música de videogame cantada, não em LP ou cassete, mas sim DENTRO DO JOGO, cantada pela ídola teen Kaori Shimizu! Foi no game Psycho Soldier, e o curioso é que a personagem principal é a colegial Athena, que depois viria a se tornar uma lutadora em King of Fighters:
GRANDES COMPOSITORES
Koji Kondo
Koji Kondo, como já disse, é uma verdadeira lenda viva dos games. Foi o primeiro compositor profissional a fazer a trilha sonora de um jogo: o primeiro Punch-out, em 1984, assim que entrou na Nintendo. E, logo após, nada mais nada menos que Super Mario Bros. Seu trabalho trouxe uma revolução: todos os jogos de plataforma, a partir de então, apresentaram músicas que imitavam as melodias alegres e relaxantes de Kondo (que nunca se desvinculou da Nintendo, onde integra a equipe do gênio Shigeru Miyamoto). Não menos importantes foram suas criações para o RPG Zelda, possivelmente um pouco mais sérias, mas nem por isso carentes de vitalidade. Os temas de Zelda e Mario são dois ícones da Nintendo, tão fortes e famosos quanto seus personagens. Até o Ex-Beatle Paul McCartney, ao encontrá-lo, cantarolou a melodia tema de Mario Bros em sinal de admiração.
Koji Kondo trabalha na Nintendo até hoje, mesmo tendo assumido um papel mais de mentor para outros compositores, como Soyo Oka (de Super Mario Kart).
Koichi Sugiyama
Koichi Sugiyama é o “vovozinho” de todos os compositores de videogame. Um maestro com formação clássica e já bastante conhecido por trabalhos na TV e no cinema nos anos 70 e 80, ele escreveu uma carta à empresa Enix pra falar de um jogo, e o pessoal da empresa ficou tão impressionado com alguém daquela estatura e idade se interessar por games que o convidou para fazer músicas para seus jogos. O mais famoso deles é sem dúvida a série Dragon Quest (Dragon Warrior nos EUA), que começou em 1986 no Nintendinho e estabeleceu as bases para como deviam ser as músicas de RPG. Sugiyama, claro, não sabia programar as músicas pro NES, mas ele mandava elas prontas e o pessoal convertia do jeito que dava.
Ele é considerado a principal inspiração para outros compositores de música para jogos, como Nobuo Uematsu, e tem sido referido como o “O Poderoso Chefão da música de videogames”.
Sugiyama foi um dos primeiros compositores de videogame a gravar com uma orquestra ao vivo. Em 1986, o CD Dragon Quest I Symphonic Suite foi lançado, utilizando a London Philharmonic Orchestra para interpretar as melodias de Sugiyama. As oito melodias da trilha sonora (Abertura, Castelo, Cidade, Campo, Masmorra, Batalha, Batalha Final e Final) definem o modelo para a maioria das trilhas sonoras de videogame RPG lançadas desde então, centenas das quais foram organizadas de maneira semelhante.
Sugiyama recebeu dois prêmios Recorde Mundial do Guinness, um pelo primeiro balé inspirado em videogames e o segundo por ser o mais antigo compositor musical de videogame.
Miki Higashino
Um marco na história da gamemusic é o lançamento do primeiro jogo da série de sucesso Gradius, um jogo de tiro lançado pela Konami nos Arcades em 1985. Não seria exagero dizer que a música de Miki Higashino (Miki-Chan), rica em sons metálicos de alta frequência (mas nitidamente limitada pela capacidade de som do chip AY-3-8910 (PSG), algo que só se resolveria em 1987), não só estabeleceu um “estilo Konami” de som dentro da empresa, como influenciou toda uma geração de futuros músicos de games, a começar por Yuzo Koshiro, que admitiu ter começado a programar música de games imitando as melodias de Gradius no seu recém-comprado computador pessoal PC-88.
Trabalhou na Konami de 1985 até 2002. Agora é freelancer.
Tokuhiko Uwabo
Tokuhiko Uwabo (conhecido por Bo ou Hairy Uwa) é um dos maiores (e mais antigo) compositores da SEGA, e é praticamente um desconhecido da maioria dos gamers, pois fez parte da “fase romântica” dos videogames, onde os profissionais se ocultavam atrás de diversos pseudônimos que só apareciam nos créditos finais dos jogos que, de tão desafiadores, pouca gente terminava. Compôs temas imortais e músicas que soam tão boas hoje como soavam nos anos 80, como Alex Kidd in the miracle world, Space Harrier II, Phantasy Star, Columns, Choplifter e Super Monaco GP. Também participou da conversão das músicas dos jogos Ys e Sorcerian para o Master System. Ele que escreveu o driver de som do Master System, que depois foi usado por todo mundo que fazia os jogos pra essa máquina.
Pelo seu grande conhecimento do chip de som do Megadrive, assessorou vários compositores a transpor suas músicas para o 16-bit, como programador de som, em jogos como Revenge of Shinobi, Streets of Rage, Moonwalker, Castle of Illusion, Quackshot, Sonic 3 e Sonic & Knuckles.
Hiroshi Kawaguchi
Hiroshi Kawaguchi (também conhecido como Hiroshi Miyauchi, ou Master Hiro) era um jovem músico que entrou na SEGA como programador e 1 ano depois conseguiu uma oportunidade de mostrar seu talento, trabalhando em conjunto com o famoso produtor de jogos Yu Suzuki. Logo de início emendou uma série de “clássicos” inesquecíveis para o Arcade, um atrás do outro. Jogos como Space Harrier, Fantasy Zone, Enduro racer, Hang On, After Burner I e II, Out Run e Power Drift são lembrados com carinho até hoje, em parte pela maestria de criação e programação de Suzuki, em parte por causa da música.
Em 1998 entrou para uma banda oficial da SEGA, a S.S.T. (Sega Sound Team) Band, tocando teclado ao lado de Koichi Namiki e mais outros dois compositores. Essas bandas oficiais já existiam há algum tempo no Japão, mas se limitavam a reproduzir a música original com instrumentos reais. Na SST Kawaguchi inovou ao fazer versões longas, muitas vezes criando novas melodias ao estilo do Rock Progressivo, e assim fez versões primorosas de suas músicas, sendo a melhor delas a “Magical sound shower”, de Out Run.
Em 2000, Hiro trabalhou no estúdio AM3 (“Hitmaker”) da Sega, e agora faz apresentações com a Banda “H”, em parceria com Takenobu Mitsuyoshi (que compôs as trilhas de Daytona USA e Sega Rally).
INFLUÊNCIAS
O próprio Koji Kondo cita Henry Mancini como sua grande influência. Ouvindo o tema minimalista da Pantera Cor-de-Rosa, não fica difícil entender o porque.
“Quando eu trabalhava para Out Run eu gostava de música latina na época, e fui muito influenciado por um músico chamado Naoya Matsuoka, que faleceu recentemente. Eu estava ouvindo muitas músicas instrumentais de artistas como Masayoshi Takanaka e Casiopea, e escolhi elementos que gostei para fazer a música da série Out Run.”
(Hiroshi Kawaguchi)
ARRANJOS
As músicas de Castlevania se prestam a belíssimas interpretações clássicas, com vários álbuns lançados neste estilo. Seus arranjos deixam extasiados qualquer amante da música clássica. Confira:
Já se você gosta de Heavy Metal e muita distorção de guitarra, não se preocupe. Castlevania também se adequa muito bem a este estilo:
ENTREVISTAS
História da gamemusic
Sega’s S.S.T. Band Live (1990 High Quality 60FPS VHS Video Game Music Concert Footage)
https://www.youtube.com/watch?v=jyvIr0wjsLs
E Saiii mais um post espetacular na história dos games, senhoras e senhores!! 😀
Porque o chip de som chamava-se “Paula”? Que bonitinho. 🙂
Paula era o nome da namorada do designer do chip. Devia ser porque era um chip sexy, inteligente, multifunções e à frente do seu tempo. Natural que fosse chamado de Paula.
http://www.amiga-hardware.com/showhardware.cgi?HARDID=1460
😀 Sorriso estampado no rosto!!! 😳 e com vergonha!
Adoreiiii!!! ;*********
Não sei se o autor do blog ou alguém que for ler essa minha mensagem vai poder me ajudar mas vai lá: eu tenho uma música da abertura do jogo Legend of Zelda orquestrada… muito linda. Logo no começo ela se parece com a música do Super-Homem. Gostaria de saber qual é a orquestra que tocou essa música. Uns dizem London Symphony Orchestra, outros dizem London Philharmonic outros dizem que é uma orquestra de tóquio… tô na dúvida. Alguém pode ajudar???
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