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Caso chegue ao Brasil, assistam ao mais novo documentário de Michael Moore (Tiros em Columbine, Fahrenheit 9/11), Sicko. É um assunto que, à primeira vista, não nos interessa muito (o serviço de saúde dos EUA), mas não esqueçam de que nós, índios brasileiros, nos espelhamos no que dos EUA têm de pior, e o modelo de saúde segue quase à risca o que os EUA adotam desde os anos 70, ou seja, diminuir os investimentos em saúde ao ponto de causar um colapso no sistema público, obrigando as pessoas a dependerem de um plano particular.

O filme tem momentos fantásticos, do tipo “eu só não vou dizer com todas as palavras porque iriam me processar, mas se você não for um completo idiota, vai entender“, especialmente na parte da corrupção dos congressistas norte-americanos (vejam só, nós também importamos isso… ou será que ensinamos?). Tem um final realmente emocionante, com a ida dos heróis do 11 de setembro (rejeitados pelos planos de saúde e sem dinheiro pra hospital) a Cuba (isso mesmo!) pra obter um tratamento DIGNO, e uma singela homenagem dos cubanos.

Mas a parte que mais abre os olhos é quando Moore visita outros países ditos “civilizados”, como Canadá, França e Grã-Bretanha, onde o serviço de saúde é gratuito, universal e, o mais importante: de QUALIDADE. A entrevista com Tony Benn, antigo deputado britânico, é uma aula de cidadania:

Quando surgiu esta idéia de que qualquer cidadão britânico deveria ter direito a cuidados de saúde?

sicko tony benn

Se voltarmos atrás, tudo começou com a democracia. Antes de podermos votar, todo o poder estava nas mãos dos ricos. Se tivesse dinheiro, podia ter cuidados de saúde, educação, prevenir-se para a velhice… E o que a democracia fez foi dar o voto aos pobres, e passou o poder do mercado para a cabine de voto, da carteira, para o voto.
E o que as pessoas disseram foi muito simples, elas disseram: “Na década de 1930, tivemos desemprego em massa, mas não houve desemprego durante a guerra. Se se pode ter emprego pleno por matar Alemães, por que não se pode ter emprego pleno para construir hospitais, para construir escolas, contratando enfermeiras, contratando professores?” Se conseguimos arranjar dinheiro para matar pessoas, conseguimos arranjar dinheiro para ajudar as pessoas.

Este panfleto foi lançado em 1948, de uma forma muito direta:
“O seu novo Serviço Nacional de Saúde começa a 5 de Julho. Ele irá fornecer-lhe todos os cuidados médicos, dentários e de enfermagem. Qualquer pessoa, rica ou pobre, homem, mulher ou criança pode utilizá-lo, qualquer parte dele. Não tem custos, exceto para alguns casos especiais, não há obrigações de seguro, mas não é uma caridade. Estão pagando quando são contribuintes, e irá aliviar as suas preocupações financeiras em tempos de doença.”

De alguma forma, estas poucas palavras resumem tudo.

Tony Benn
revolucao francesa
A Liberdade Guiando o Povo, por Eugène Delacroix (1830, Louvre, Paris)

Acho que a democracia é a coisa mais revolucionária do mundo. Mais revolucionária do que idéias socialistas ou de qualquer outra pessoa. Se tiver poder, ele é usado para prover as suas necessidades e as da sua comunidade. E esta idéia de escolha, de que o capital fala constantemente, “tem que ter uma escolha”, a escolha depende da liberdade de escolher. Se você estiver coberto de dívidas não vai ter liberdade de escolha. Parece que o sistema se beneficia se o trabalhador comum estiver coberto de dívidas. As pessoas em dívida perdem a esperança, e pessoas sem esperança não votam. Dizem que todas as pessoas devem votar, mas acho que se os pobres, se eles votassem em pessoas que representassem os seus interesses, seria uma verdadeira revolução democrática. E não querem que isso aconteça, por isso mantêm as pessoas oprimidas e pessimistas.

Penso que há duas formas nas quais as pessoas são controladas: em primeiro lugar, assustar as pessoas, e em segundo, desmoralizá-las. Uma nação educada, saudável e confiante é mais difícil de governar. E acho que há um elemento no pensamento de algumas pessoas, “não queremos que as pessoas sejam educadas, saudáveis e confiantes, porque ficariam fora de controle.” 1% da população mundial detém 80% da riqueza. É incrível que as pessoas tolerem isso, mas elas são pobres, estão desmoralizadas, estão assustadas. E então, pensam que o mais seguro é seguir ordens e esperar o melhor. E esperar pelo melhor é o que fazemos desde o momento em que nascemos.

bandeira da espanha Ler em espanhol (por Teresa)

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Anônimo
Anônimo
2 julho de 2007 4:27 pm

Obs. sobre o quadro apresentado:

‘A Liberdade Guiando o Povo’, por Eugène Delacroix (1830, Louvre, Paris) é uma das obras mais nitidamente românticas e célebres do pintor francês. A tela, comprada pelo governo francês, mas considerada excessivamente incitadora, só foi exposta em 1848.

Eduardo do Porto
Eduardo do Porto
6 julho de 2007 8:29 am

Dou os parabéns a este blog por este excelem«nte post. Quanto à Sr.ª Maria do Carmo, por favor, tenha tento na lingua! Tivemos em Portugal uma ditadura de mais de 48 anos! Quando instauramos a democracia, esta Pais estava de rastos. Chegamos a ter mais de 70 % da população analfabeta! E ainda hoje, passados tantos anos sobre o 25 de Abril de 1974, sofremos as consequências de não termos optado pela democracia mais cedo. Melhoramento interior? É muito bonito de falar, mas aquilo que assegura uma sociedade decente é um Estado democrático, de direito e com separação de poderes.… Read more »

Eduardo do Porto
Eduardo do Porto
6 julho de 2007 8:48 am

E falando de democracias e ditaduras, pergunto a vocês se conhecem um único país regido por uma ditadura, e que seja desenvolvido (bons níveis de riqueza produzida, boa distribuição da riqueza, bons serviços públicos…). Hmm, deixa-me adivinhar… Não conhecem nenhum, pois não?

Maute
Maute
8 julho de 2007 8:24 pm

Os EUA são regidos por uma ditadura (mental) e possuem todos esses bons índices.

Maute
Maute
8 julho de 2007 8:25 pm

😀

Eduardo do Porto
Eduardo do Porto
9 julho de 2007 8:29 am

Convém não brincar com as palavras e com os conceitos. Escolha, prefere viver nos EUA ou na Coreia do Norte? Ou prefere viver na Arábia Saudita? Ou no Sudão? Ou no Paquistão? Por falar em Paquistão, compare o desenvolvimeto deste País com o seu vizinho, a India (sim, a India, mesmo com os seus milhares de problemas, está a ter um bom desenvolvimento).
Ah, gente boa. Vivem no meio da abundância e pensam que passar fome é que é bom…

Eduardo do Porto
Eduardo do Porto
9 julho de 2007 8:29 am

Convém não brincar com as palavras e com os conceitos. Escolha, prefere viver nos EUA ou na Coreia do Norte? Ou prefere viver na Arábia Saudita? Ou no Sudão? Ou no Paquistão? Por falar em Paquistão, compare o desenvolvimeto deste País com o seu vizinho, a India (sim, a India, mesmo com os seus milhares de problemas, está a ter um bom desenvolvimento).
Ah, gente boa. Vivem no meio da abundância e pensam que passar fome é que é bom…

maria do carmo
maria do carmo
9 julho de 2007 10:43 pm

Sr Eduardo,nunca defendi nenhum governo ditatorial. Mas, tenho certeza que a democracia é mais um ideal do que uma realidade, mesmo naqueles países que se apresentam como tal. E também acredito que só por uma melhora interna de cada um ela deixará de ser um ideal para tornar-se real. Repare , aqui no Brasil não faltam leis, mas o problema está em cumpri-las. Elas são constantemente violadas e, o poder judiciário que, tem o dever constitucional de punir os transgressores não o faz, por conta da existência de uma série de artifícios legais, que fazem com que um processo possa… Read more »

Eduardo do Porto
Eduardo do Porto
10 julho de 2007 8:30 am

Fico contente com o que escreve. Lido muito com as dúvidas que a afligem (sou aluno de Direito, estou a tirar o curso à noite, porque de dia tenho que trabalhar). Mas uma coisa vai se tornando clara para mim: a democracia é um farol. Para conseguirmos chegar a uma sociedade decente, em que sejam respeitados os Direitos do Homem (preferia dizer do Ser Humano), temos, nós todos, que lutar por iso. A liberdade não se conquista numa só “batalha”. Temos que, incessantemente lutar por ela. Quanto aos podres da política actual, não há como negar. Mas mesmo assim temos… Read more »

Saindo da Matrix
Saindo da Matrix
7 março de 2008 11:00 am

Uma ótima resenha do filme Sicko, que estreou essa semana nos cinemas brasileiros, feita por Fernando Vasconcelos, do Kinemail: SICKO – $O$ SAÚDE A partir de um tema pouco atraente como planos de saúde e no gênero ‘documentário’, que afugenta multipléxicos com baldes de pipoca na fila, é preciso admitir que Sicko é um filme muito divertido, agradável de ver, nas suas quase duas horas de duração. Qua a tática de Michael Moore é um tanto grosseira, para que o público bundão norte-americano (e não os ‘críticos de cinema’) capte a mensagem, não há dúvida. E isso significa uma simplificação… Read more »

Coringa
Coringa
7 março de 2008 1:58 pm

…ou seja, uma boa dose de senso HUMANITÁRIO (e isto sim deveria ser ensinado nas faculdades), e uma boa paulada na fria ‘lógica’ capitalista.

Como faz bem a lucidez, não?

maria do carmo
maria do carmo
5 julho de 2007 10:50 pm

Lionheart, concordamos…ainda não se descobriu nenhum outro melhor, apesar de tudo.Quanto às mulheres é isto aí.Tanta luta para assistir este circo de horrores…muitas ( ou seria melhor dizer a maioria?) passaram a imitar o comportamento masculino nos seus aspectos piores. Mas é como filosoficamente vc diz ” é o espírito do tempo” Foi um prazer trocar idéias com vc.

Anônimo
Anônimo
5 julho de 2007 10:40 pm
Lionheart
Lionheart
5 julho de 2007 9:59 pm

maria do carmo, se você fosse elitista eu já ficaria aliviado. Estava pensando que você ia começar a defender regimes tirânicos… Também acho que não existe democracia alguma, na face da Terra, que seja perfeita. Acontece que é o “menos pior” dos regimes disponíveis no momento. Isso já é alguma coisa.
Quanto às popozudas e cachorras urrando… É o “espírito do tempo” minha cara. As mulheres clamaram por liberdade. Ganharam a liberdade. Liberdade de poder ser o que elas bem entenderem, desde profissionais competentíssimas (há muitas)a vadias renomadas (há mais do que deveria). Paciência…

maute
maute
2 julho de 2007 4:48 pm

bom post, concordo plenamente com essa idéia de que a democracia é a coisa mais revolucionária do mundo… como sou otimista pacas, e como faço história e leio todo dia um monte de coisa q o homem já fez durante sua existencia, percebo que há, de fato, um movimento que tende a uma contenção de uma possível ascenção da humanidade… o positivo é q essa ascenção é cada vez mais possível, ao contrário de antes… acredito na inevitabilidade de certas coisas, e uma delas é a chegada do danado do equilíbrio tanto no micro como no macrocosmo…

Anônimo
Anônimo
2 julho de 2007 10:19 pm

Ola Acid, parabens pelos seus artigos! Aproveitando q. vc esta falando de documentario, gostaria de saber se vc jah viu ou ouviu falar de um documentario feito por uma tv francesa a alguns anos atras, sobre a farsa do homem na lua. Neste filme sao entrevistados as personalidades( tipo Henry Kissinger)que estavam envolvidas no acontecimento e confirmavam(?) a fraude. Assisti isso na tv japonesa narrado em japones que eu nao domino e “deduzi” o conteudo. A minha duvida ateh hoje eh: deduzi errado? pois cade o bendito documentario que nao consigo achar nem referencia na internet? Pls help. grata pela… Read more »

Belchior
Belchior
3 julho de 2007 12:38 am

“No escritório em que eu trabalho e fico rico
Quanto mais eu multiplico diminui o meu amor”

Eddie Vedder
Eddie Vedder
3 julho de 2007 12:39 am

” Sorry is the fool who trades his love for hi-rise rent.
Seem the more you make equals the loneliness you get. “

Karos
Karos
3 julho de 2007 2:53 pm

Se não me engano já temos um partido republicano!

maria do carmo
maria do carmo
3 julho de 2007 10:35 pm

Infelizmente descreio da democracia, pois para que ela exista são necessárias duas coisas: a melhora interna do ser humano ( menos egoísmo e ambição)e uma população educada. Contudo, não é isto que vemos. Em todos os aspectos parece que passamos por um período de involução e desordem.Nas artes a música popular acabou , a juventude embala seus namoros ao som das letras chulas do funk, na política vemos aqueles que foram eleitos pelo voto popular aumentando seu patrimônio por meio do roubo mais descarado.Nunca são punidos, pois estamos num Estado de direito cujas leis são muito lenientes com os poderosos.… Read more »

bono
bono
4 julho de 2007 2:17 am

E desmoralizar as pessoas é o principal papel das religiões.

Radical Chic
Radical Chic
5 julho de 2007 11:15 am

Pra quem quiser baixar por torrent:

http://www.mininova.org/tor/777166

Lionheart
Lionheart
5 julho de 2007 11:26 am

Fiquei curioso, Maria do Carmo. Se você não acredita em democracia, o quê você sugere no lugar? E o que ela (a democracia) tem a ver com o gosto musical da população?

maria do carmo
maria do carmo
5 julho de 2007 8:52 pm

Realmente isto é uma pergunta que me instiga. O que eu quis dizer é que a democracia para efetivamente se realizar necessita que as pessoas se transformem internamente, aprendendo a ser mais solidárias e cumpridoras das leis. Quanto ao gosto musical dei apenas um exemplo de que a cultura há muito tempo foi pelo ralo. E, sinceramente só um povo educado pode entender e batalhar para viver num regime democrático.Vc pode estar pensando que eu sou uma pessoa elitista. Mas,pelo contrário. Adoro as músicas de Pixinguinha , Cartola …enfim,compositores populares no sentido real do termo.Foram pessoas pobres, de pouca instrução… Read more »

Coringa
Coringa
1 novembro de 2014 5:47 pm

Incrível más real…

Myriam Sidibe: O simples poder da lavagem de mãos!
TED : http://on.ted.com/r0DUO

(Com legendas em português)

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