JEAN MICHEL JARRE (Parte 5)

JEAN MICHEL JARRE (Parte 5)

ELECTRONICA 1: THE TIME MACHINE

De 2007 a 2011 Jean-Michel Jarre ficou fazendo sua primeira turnê “mundial”, se apresentando ao vivo com Oxygène Live pela Europa e EUA, e aparentemente foi aí ele pegou gosto pelos velhos sintetizadores e voltou a mexer nos botões e manivelas de antigamente, e o fruto disso nós colhemos em 2015, início de uma “nova Era musical para Jarre”, pois aí foi lançado Electronica 1: The Time Machine, uma colaboração com os mais diversos artistas (e foram tantos que quiseram trabalhar com ele que no ano seguinte saiu outro volume).

“Todas essas pessoas têm em comum duas coisas diferentes:
Um, eles têm uma abordagem orgânica em relação ao som.
Dois, todos eles são geeks”.

Jean-Michel Jarre; The Guardian

Muitas bandas como o Orb, Orbital e Prodigy apontam Jarre como o “Padrinho do Movimento Tecno” por sua influência na música eletrônica há vários anos. Então é natural que novos e velhos nomes estejam nesta celebração à música eletrônica, nos mais diversos estilos. Tem parceria com Pete Townshend (do The Who), Massive Attack, entre outros. Eu tenho muitas músicas preferidas nesse álbum, mas vou comentar algumas, como a parceria com Moby, uma viagem sonora com muuuuuuitas camadas e que me deixa em êxtase:

Suns Have Gone (Jean-Michel Jarre & Moby)

John Carpenter, diretor dos filmes Fuga de Los Angeles, A coisa (The Thing) e Halloween, entre outros, sempre compõe a trilha de seus filmes com seus sons eletrônicos hipnotizantes, e aqui não é diferente. Jarre e ele criam juntos uma atmosfera sombria que evoca imagens de todos esses filmes:

A Question of Blood (Jean-Michel Jarre & John Carpenter)

“Eu me sinto muito privilegiado por ter tocado a China e nas pirâmides, todos esses lugares fantásticos, mas isso criou uma espécie de cortina de fumaça entre o público e eu como músico. Para mim, o conceito era uma extensão da minha música e não o contrário, mas de repente eu estava vampirizado por luzes, lasers e grandes shows. Eu caí naquele excesso de 80 e 90, essa histeria do rock’n’roll. Eu precisava parar tudo isso e focar na música.” disse Jarre em entrevista para esse álbum. Para ele, fazer música eletrônica é como cozinhar: “Existe essa abordagem tátil e sensual ao som, colocando as mãos nas frequências, manipulando fisicamente as ondas de som com um mouse”.

Jean-Michel Jarre

Acho que finalmente Jean Michel Jarre se “encontrou” em fazer algo diferente e ainda assim com sua cara. A faixa Automatic parte 2 (com Vince Clarke) é quase um pastiche dele mesmo dos tempos de Zoolook, mas um BOM pastiche. Já Conquistador (com Gesaffelstein) e Immortals (com Fuck Buttons) são NOVAS, vibrantes, corajosas, não devendo nada a essa nova geração, até porque foram feitas COM a nova geração:

Immortals (Jean-Michel Jarre & Fuck Buttons)

A música Zero Gravity, que Jarre fez com Tangerine Dream, é especial tanto por eles serem contemporâneos e referência em música eletrônica, como porque logo após essa colaboração o criador do grupo, Edgar Froese, morreu. Por isso mesmo há um pequeno documentário sobre essa faixa:

Jean-Michel Jarre with Tangerine Dream (Track Story)

E há também um mini-doc maior, envolvendo os outros colaboradores:

Electronica (Behind the Scenes)

Jarre também fez uma parceria com o grupo Air na faixa Close Your Eyes, que mistura técnicas antigas e modernas de composição, com loops feitos ainda com fitas magnéticas. Aqui ele dá uma aula sobre composição e a própria história da música eletrônica enquanto fala da criação desta faixa em detalhes:

In The Studio with Jean-Michel Jarre

ELECTRONICA 2: THE HEART OF NOISE

Um ano depois de Electronica 1, Jarre aparece com a continuação onde ele colabora com grandes nomes dos anos 80, como Gary Numan, Cyndi Lauper, Pet Shop Boys e Yello, assim como novos nomes e velhos parceiros.

Electronica 2: The Heart of Noise (Official Trailer)

E se houve alguma preocupação de que o Electronica 2: The Heart of Noise não causasse a mesma agitação do primeiro, Jarre tinha um ás na manga: o ex-funcionário da CIA Edward Snowden. Um objetivo definidor do Electronica como projeto era de que Jarre viajaria para encontrar cada um dos colaboradores nos dois álbuns, porque, como ele mesmo disse: “Todos nós pensamos que estamos conectados ao mundo agora, mas não estamos falando com nossos vizinhos. Isso significava dirigir duas horas até Viena para encontrar o Tangerine Dream, ou voar para o Brooklyn para trabalhar com Hans Zimmer ou Laurie Anderson. No caso de Snowden, envolvia entrar em contato com o jornal The Guardian, que o encaminhava às pessoas certas para chegar a Snowden, seguido por uma viagem até Moscou, onde o denunciante recebera asilo. A faixa Exit não é tanto um dueto, mas sim um rolo compressor de techno que fica mais lento no meio para permitir que Snowden entregue algumas verdades que devem tranquilizar qualquer amante da liberdade até os ossos. “Dizer que você não se importa com o direito à privacidade porque não tem nada a esconder não é diferente de dizer que não se importa com a liberdade de expressão porque não tem nada a dizer”, Snowden opina, antes de advertir: “O que pode não tem valor para você hoje, pode ter valor para uma população inteira, pessoas inteiras, um modo de vida inteiro amanhã. E se você não defender isso, então quem defenderá?”. Exit fez manchetes em todo o mundo, e capturou o zeitgeist da paisagem política da época de forma que poucos em 2016 conseguiram.

Jean-Michel Jarre with Edward Snowden (Track Story)

A cereja do bolo desse álbum é Electrees, feita em parceria com Hans Zimmer, compositor dos filmes A Origem (Inception) e Interstellar. Essa faixa poderia ser o climax musical de qualquer filme, aliando a sensibilidade melódica de Zimmer pra extrair emoções dos violinos com toda a textura musical de Jarre pra criar um vasto landscape sonoro. Poderia estar facilmente no final do próprio filme Interstellar ou mesmo em 2001 Uma odisséia no espaço.

Electrees (Jean-Michel Jarre & Hans Zimmer)

Circus, que ele fez em parceria com Siriusmo, é a faixa mais dançante, que me lembra um pouco o Daft Punk (Aliás, senti muito a falta desse duo francês com Jarre). Traz também uma certa nostalgia, pois lembra a Music box concerto:

Circus (Jean-Michel Jarre & Siriusmo)

Lembram que bem no início da carreira Jarre fez melodias para Christophe cantar? Pois bem: dessa vez eles voltaram a fazer uma última parceria, na música Walking the Mile. Foi um fim digno pra um relacionamento estremecido, pois Christophe morreu em abril de 2020, vítima do Coronavírus.

OXYGÈNE 3

No final de 2016 Jarre lança um NOVO álbum baseado em Oxygène. Segundo ele mesmo explica nessa entrevista:

“Eu não necessariamente gosto muito de aniversários… Mas quando eu estava gravando o Electronica eu fiz uma música (hoje Oxygene 19) que me fez pensar sobre o que Oxygène poderia ser se eu estivesse compondo hoje. Então eu peguei o 40º aniversário do primeiro álbum como um prazo para me esforçar para ver se eu poderia compor este novo capítulo em seis semanas, assim como fiz para o primeiro: provavelmente para evitar pensar demais, se era um boa idéia ou não, e também gravar tudo de uma só vez… A idéia não era copiar o primeiro álbum, mas sim manter o dogma de embarcar os ouvintes em uma jornada do começo ao fim com diferentes capítulos, todos ligados entre si.

O que tornou o primeiro Oxygène tão diferente na época é provavelmente o aspecto minimalista e o fato de que quase não há bateria, e eu queria manter essa abordagem, criando o groove principalmente com as sequências e a estrutura das melodias apenas, através de uma arquitetura de sons. Quando eu fiz o primeiro Oxygène nos dias do vinil, eu tinha uma estrutura em mente dividida em 2 partes, ajustando os lados A e B de um álbum. E desta vez eu quis fazer o mesmo: um lado sendo mais escuro, o outro sendo mais brilhante.

Eu fiz o primeiro Oxygène em um gravador de 8 faixas com pouquíssimos instrumentos, sem outra escolha além de ser minimalista. Eu tentei manter essa abordagem minimalista para Oxygène 3. Alguns momentos são construídos em torno de um ou dois elementos, como no primeiro volume.”

Jean-Michel Jarre
Entrevista à FRANCE 24: Breathing new life into Oxygène

Não há uma faixa em Oxygène 3 que eu goste. Parece pouco inspirado, mas pelo visto ele gostou da experiência, já que em 2018 foi a vez de Equinoxe ganhar uma continuação, e desta vez com muito, MUITO melhor resultado. Mas voltemos à cronologia:

Em 2017 ele colaborou com o Gorillaz em três faixas e também foi convidado a fazer uma série de vinhetas para o canal francês France Info. As vinhetas acabaram virando o álbum Radiophonie vol. 9, com tiragem limitada a 1000 cópias.

Em 2018 ele lança um box intitulado Planet Jarre: 50 Years of Music, com 41 músicas antigas selecionadas (as quais ele não resistiu a dar seus “retoques“) e apenas duas novas: Herbalizer e Coachella Opening:

Planet Jarre: 50 Years of Music

ÉQUINOXE INFINITY

Equinoxe Infinity – Making Of

Equinoxe Infinity é uma delícia para os sentidos, Jarre de volta ao topo da sua criatividade e talento. É como se os Electronica tivessem sido um ritual de passagem para um novo renascimento aqui, utilizando tudo o que ele absorveu dos outros artistas e fazendo um som só seu:

Robots don’t cry (movement 3)
Flying Totems (Movement 2)

GREEN CONCERT

Ainda em 2018 ele toca pela primeira vez em Riyadh, na Arábia Saudita. “Foi um concerto ao ar livre na frente de 50.000 pessoas, incluindo mulheres e homens juntos! Foi a primeira vez que você podia ver mulheres dançando e batendo palmas com homens presentes em um concerto. Foi muito emocionante, porque nunca tinha acontecido antes”, diz Jarre.

The Green Concert

Em 2019 Jarre fez a identidade sonora para o banco HSBC, um conjunto de sete vinhetas distintas criadas para se adaptar aos 66 mercados mundiais da marca. Além disso, foi publicada a autobiografia de Jarre, intitulada Mélancolique Rodéo, e lançou um app pra Iphone intitulado EoN, que consiste de um algoritmo de Inteligência Artificial que manipula um banco de dados criado a partir de 7 horas de material gravado pelo Jarre. Toda vez que o aplicativo é iniciado, ele toca uma música que nunca mais vai se repetir e a música é sempre diferente em todos os dispositivos, criando assim um álbum infinito:

Jean-Michel Jarre apresentou uma app na Web Summit

Bom, aqui se encerra (por enquanto, espero) a série de posts sobre Jean-Michel Jarre. Meu muito obrigado ao site Jarrefan Brazil por manter viva a chama desse compositor magnífico com todas as informações a respeito dele. Desejo que velhas gerações relembrem com carinho ou conheçam esse gênio junto às novas gerações, que com certeza ele atrairá por seu som atemporal. Veremos o que o futuro ainda nos trará em termos de Jarre.

jarre 5 lights

Referência:
Jarrefan Brazil – Masterclass com Jean-Michel Jarre tem surpresa com Snowden;
ARTE: Entrevista sobre Equinoxe Infinity

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Ricardo Alves de Melo
Ricardo Alves de Melo
3 maio de 2020 9:52 pm

Parabéns pelos artigos. Jarre é eterno, e esperamos ver um dia uma apresentação dele no Brasil.

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