CORPO INTERPRETA PENSAMENTO ABSTRATO LITERALMENTE

Por Natalie Angier (New York Times)

A teoria da relatividade nos mostrou que o tempo e o espaço estão interligados – ao que nosso cérebro sabichão poderia bem responder: “Diga algo que eu não sei, Einstein”.

Pesquisadores da Universidade de Aberdeen descobriram que quando pessoas foram solicitadas a participar de uma pequena viagem mental no tempo e relembrar eventos passados ou imaginar acontecimentos futuros, o corpo dos participantes interpretava as metáforas embutidas em como nós normalmente conceitualizamos o fluxo do tempo. Enquanto pensavam nos anos passados, os participantes se inclinavam levemente para trás; quando fantasiavam sobre o futuro, eles se inclinavam para frente. Esses desvios não eram tipo a Torre de Pisa, mas correspondiam a 2 ou 3 milímetros para uma direção ou outra. No entanto, a direção era clara e consistente.

“Quando falamos sobre o tempo, muitas vezes usamos metáforas espaciais, como Espero o momento de poder te ver, ou Estou refletindo sobre o passado“, disse Lynden K. Miles, que conduziu o estudo com seus colegas Louise K. Nind e C. Neil Macrae. “Foi gratificante para nós tomar um conceito abstrato como o tempo e mostrar que ele foi manifestado em movimentos corporais.”

O novo estudo, publicado em janeiro no jornal Psychological Science, faz parte de um campo imensamente popular chamado cognição incorporada, a ideia de que o cérebro não é a única parte do nosso corpo com uma mente própria.

“A forma como processamos informação está relacionada não apenas aos nossos cérebros, mas ao nosso corpo inteiro”, disse Nils B. Jostmann, da Universidade de Amsterdã. “Usamos todos os sistemas disponíveis para chegar a uma conclusão e compreender o que está acontecendo”.

Frio e calor

Pesquisas sobre cognição incorporada revelaram que o corpo leva a linguagem ao coração e pode ser terrivelmente literal.

Dizemos que uma pessoa é calorosa e adorável, o oposto de fria e distante, não é? Num estudo recente de Yale, pesquisadores dividiram 41 estudantes universitários em dois grupos e casualmente pediram que os membros do Grupo A segurassem uma xícara de café quente, enquanto os do Grupo B seguravam café gelado. Os estudantes foram então levados a uma sala de testes e solicitados a avaliar a personalidade de um individuo imaginário com base em algumas informações.

Estudantes que tinham segurado a bebida quente tiveram muito mais probabilidade de julgar o personagem fictício como caloroso e amigável do que os que tinham segurado o café gelado.

Ou talvez você já tenha sentido o vento frio da exclusão social. Quando pesquisadores da Universidade de Toronto instruíram um grupo de 65 estudantes a se lembrar de um momento em que se sentiram socialmente aceitos ou socialmente desprezados, os que tiveram memórias de rejeição disseram que a temperatura da sala estava 2,8ºC, em média, mais fria do que os que tinham sido embalados por pensamentos calorosos envolvendo a aprovação dos colegas.

O corpo incorpora abstrações da melhor forma que conhece: fisicamente. A baixeza moral, um lapso ético, nada mais é do que uma mancha no caráter de um indivíduo. Um momento para os Lencinhos de Limpeza Lady Macbeth. Um estudo mostrou que os participantes solicitados a refletir sobre uma transgressão moral pessoal, como adultério ou colar numa prova, tiveram maior tendência a pedir um lenço anti-séptico do que os participantes instruídos a relembrar boas ações que fizeram.

Quando confrontado com uma palavra ou expressão de duplo sentido, uma bifurcação verbal na estrada, o corpo considera o conselho de Yogi Berra. Num relatório publicado no último mês de agosto no Psychological Science, Jostmann e seus colegas Daniel Lakens e Thomas W. Schubert exploraram o nível no qual o corpo combina peso e importância. Eles descobriram, por exemplo, que quando estudantes ouviam que determinado livro era vital para o currículo, eles achavam que o livro era fisicamente mais pesado. Estudantes que ouviam que aquele livro tinha importância secundária para os estudos achavam o livro mais leve.

Os pesquisadores queriam saber se a sensação de peso poderia influenciar o julgamento das pessoas de forma mais ampla.

Numa série de experimentos, participantes foram orientados a responder questionários anexados a uma prancheta de metal com um compartimento na parte de trás capaz de armazenar papéis. Em alguns casos, os compartimentos estavam vazios, e a prancheta pesava apenas 658 gramas. Em outros casos, os compartimentos continham papéis, e a prancheta pesava 1,039 quilo.

Os participantes seguravam uma prancheta leve ou pesada, enquanto respondiam a uma entrevista. Uma solicitava que eles calculassem o valor de seis moedas estrangeiras pouco conhecidas. Outra pedia que os alunos indicassem a importância de um comitê da universidade levar em conta suas opiniões na hora de decidir o valor de bolsas concedidas a estudantes estrangeiros. Para um terceiro experimento, os participantes foram questionados sobre seu grau de satisfação com (a) a cidade de Amsterdã e (b) o prefeito de Amsterdã.

Em todos os estudos, como sugerem os resultados, o peso da prancheta influenciou. Os alunos que seguravam a prancheta mais pesada achavam que as moedas estrangeiras eram mais valiosas do que aqueles com as pranchetas mais leves. Os participantes com pranchetas mais leves insistiam que os estudantes deveriam ter peso maior na hora de decidir sobre as questões financeiras da universidade. Os que seguravam a prancheta mais pesada adotaram um estado mental mais rigoroso, e se mostraram mais prováveis a considerar as conexões entre a habitabilidade de Amsterdã e a eficácia de seu líder.

Evolução

Segundo Jostmann, a prontidão do corpo em levar em conta fatores físicos na sua deliberação sobre temas aparentemente não relacionados e altamente abstratos muitas vezes faz sentido. “A questão de como os humanos veem a gravidade é útil evolutivamente”, disse ele.

“Uma coisa pesada significa que devemos cuidar dela”, continuou. “Coisas pesadas não são facilmente transportadas, mas podem facilmente nos intimidar”.

O corpo em reflexão prefere uma abordagem mais prática e a gesticulação mostrou que pode ajudar crianças a aprender matemática.

Entre alunos que tinham dificuldade com equações do tipo 4+5+3=x+3, por exemplo, o desempenho melhora acentuadamente se eles são ensinados os gestos certos: agrupar os números do lado esquerdo com dois dedos na forma de um “V”, depois apontar o indicador para o espaço em branco à direita.

Para aprender como rodar um objeto mentalmente, primeiro tente uma mímica. “Se você motivar as crianças a fazer o movimento de rotação com as mãos, isso as ajuda a fazer o movimento na cabeça”, disse Susan Goldin-Meadow, da Universidade de Chicago. “Simplesmente assistir aos outros não é suficiente”.

Podemos nos lamentar sobre ontem; o amanhã é apenas hipótese. Mas você sempre pode ouvir seu corpo e viver o momento intensamente.

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Anônimo
Anônimo
17 agosto de 2010 1:18 pm

O Apocalipse Quântico e O Universo Holográfico (legendado Português)
>>>
http://www.youtube.com/watch?v=I8LDJe_xpkk

Ike, do âmago do vulcão
Ike, do âmago do vulcão
19 agosto de 2010 2:33 pm

Caro GustavoLC, não querendo fazer propaganda de ninguém (O Ninguém tá no horário político |¬D)

Por acaso vc conhece o filósofo Olavo de Carvalho?

Acredito que ele será de grande valia para o que vc proprõe no seu Blog.

Assim que eu conseguir recursos ($$$) e tempo, tratarei de abrir um Blog pra mim tb, e parar de chatear nosso BBB e simpatizantes (Viva a concorrência do livre-mercado espiritual!).

E sucesso na sua empreitada filosófica. O Pais tá precisando de Filosofia, muita Filosofia.

Ike, do âmago do vulcão
Ike, do âmago do vulcão
19 agosto de 2010 2:50 pm

E valeu meu caro Fellini, pelo Huxley. Já guardei esse pedaço aqui comigo.

Isso aí tem a ver com a tal ‘engenharia social’ e com a tão desprezada ‘mentalidade revolucionária’ (o final pelo menos), e q/ tá me interessando muito no momento.

Tu é crente-cético, mas seus olhos parecem estar bem abertos.
Valeu.

Bono
Bono
21 agosto de 2010 2:04 pm

Exatamente como eu pensava que era, e agora com comprovação científica.

Mais um programa que roda na matrix está explicado para quem se interessar.

Bono
Bono
21 agosto de 2010 2:16 pm

O corpo interpreta o pensamento abstrato de forma literal e a forma literal na forma de pensamento abstrato. E nós que achávamos que tudo fazia tanto sentido e que nossas opiniões eram tão racionalmente corretas. As coisas podem ser na verdade muito menos sensatas do que aparentam se tudo oque julgamos certo ou errado não dependem da coisa em si mas das circunstâncias que nos fizeram num primeiro momento levantar a questão a ser ponderada.

Leandro
Leandro
21 agosto de 2010 9:47 pm

“Um estudo mostrou que os participantes solicitados a refletir sobre uma transgressão moral pessoal, como adultério ou colar numa prova, tiveram maior tendência a pedir um lenço anti-séptico do que os participantes instruídos a relembrar boas ações que fizeram.”

Lembrei de quando saí do cinema, ao acabar de ver o filme A Origem, e precisei cuspir urgentemente. Quase cuspi dentro do lixo dos corredores, entre as pessoas mesmo, mas esperei e fui até o banheiro. É muita sujeira e corrupção em um filme só, e as pessoas ainda acham tudo lindo, uma “MA-RA-VI-LHA”. Parece que perderam a capacidade de raciocínio.

Dohko de Libra
Dohko de Libra
22 agosto de 2010 10:34 am

Eu vi “O último mestre do ar” e saí tentando dominar os elementos! Rs… to brincando…

Lae
Lae
22 agosto de 2010 1:37 pm

Sabe o que eu reparei, Acid? O cientista do vídeo sobre os “Multiversos” fala coisas que casam exatamente com as teorias maias. Isso é, a idéia de um renascimento, de uma nova concepção de realidade… Caso contrário, o mundo irá acabar. Faz sentido pra você?

GustavoLC
GustavoLC
19 agosto de 2010 12:48 pm

Olá, Acid. Criei um blog recentemente cujo tema é filosofia em geral. Não sou filósofo, não tenho muitos conhecimentos a esse respeito, mas me interesso muito (não é a toa que sou fiel visitante do seu blog). Penso muito sobre certas coisas e pensei que talvez um blog fosse capaz de exteriorizar essas ideias. Ainda não sei direito como vou trabalhar com ele, mesmo assim, gostaria que você desse uma olhada, caso seja possível. O que você acha das cartinhas exitenciais? Elas não têm nenhum propósito aparente e não seguem nenhum padrão determinado, mas virou um hobby das horas vagas… Read more »

Leandro
Leandro
19 agosto de 2010 12:29 pm

“[…] e ficava observando a linguagem corporal dos jornalistas.”

Dia desses, liguei a tv e fiquei reparando na “linguagem” corporal do Jô Soares. Nunca havia reparado dessa forma. Ele é extremamente ligado e pensa várias coisas ao mesmo tempo (chega a ser assustador). Normalmente reparamos mais nas figuras “excêntricas” que ele traz ao programa/show, mas tentem reparar uma vez nele. Principalmente quando ele está escutando outra pessoa falar.

Dohko de Libra
Dohko de Libra
17 agosto de 2010 2:54 pm

Parabéns Acid! Esses dias você tem postado com um ar retrô de 2003, época em que vc não tinha vergonha em sair da matrix.

Samsa
Samsa
17 agosto de 2010 4:23 pm

Muitíssimo interessante!
Não tenho dúvidas que a psicologia
comportamental ainda nos trará muitas surpresas do gênero…

Anônimo
Anônimo
17 agosto de 2010 5:23 pm

Dra Marlene fala que o mal feito gera energia que é expelida pela dor

http://www.youtube.com/watch?v=XHGhxGwjQIM

Fellini
Fellini
18 agosto de 2010 5:37 am

A Sugestibilidade Humana Os ideais da democracia e da liberdade chocam com o fato brutal da sugestibilidade humana. Um quinto de todos os eleitores pode ser hipnotizado quase num abrir e fechar de olhos, um sétimo pode ser aliviado das suas dores mediante injeções de água, um quarto responderá de modo pronto e entusiástico à hipnopédia. A todas estas minorias demasiado dispostas a cooperar, devemos adicionar as maiorias de reações menos rápidas, cuja sugestibilidade mais moderada pode ser explorada por não importa que manipulador ciente do seu ofício, pronto a consagrar a isso o tempo e os esforços necessários. É… Read more »

Karla
Karla
18 agosto de 2010 9:32 am

Bom dia, Acid! Mudando de saco pra mala… Estava relendo uns posts antigos seus, mais especificamente, a “Carta Aberta aos Abduzidos”. Num certo momento vc diz: “E se eles nos “acessam” não através do físico, como conhecemos, mas a partir de um “duplo”, de uma “cópia” mais acessível, e que pra eles é perfeitamente tangível e manipulável, sendo pra nós oculta e desconhecida?” Apesar de ter forte intuição de q o q vc diz é verdadeiro (não, nunca fui abduzida q eu saiba – GRAÇAS A DEUS! – e espero q continue assim), gostaria de saber (compreender) o q te… Read more »

Acid
Acid
18 agosto de 2010 1:04 pm

Experiências pessoais, gente que conheci, e talz. A coisa em comum q percebi foi essa experiência em outros planos, outros níveis. Não ousaria dizer q eram planos espirituais, mas pode ser no inconsciente ou alguma outra forma de nos acessar q desconhecemos.

Ah, e quando alguem tiver uma questão sobre um post antigo, é melhor pra todos postar lá no post, pq eu acompanho pela página de ultimos comentarios http://www.saindodamatrix.com.br/comentarios.html e respondo. o bom é q fica dentro do contexto pra quem quiser ler depois os comentarios.

Geninha
Geninha
19 agosto de 2010 11:15 am

🙂 Esse post me fez lembrar quando assistia tv no mudo(o som me incomodava por mais baixo que estivesse) e ficava observando a linguagem corporal dos jornalistas. Era possível saber sobre o que falavam apenas observando o comportamento e expressões.

Abraços!

Leandro
Leandro
19 agosto de 2010 12:25 pm

Uma coisa interessante de se fazer é experimentar “falar” mentalmente. Ao fazer isso (experimente ler essas linhas em sua mente, agora) foque sua atenção em sua língua e perceba que ela está se mexendo. Em um grau bem minúsculo, ela está.

Martyn
Martyn
14 agosto de 2011 9:24 pm

Cidade Negra – Pensamento

http://youtu.be/PnMsq5-rxCE

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