OS 7 NÍVEIS DE CONSCIÊNCIA NO SUFISMO

OS 7 NÍVEIS DE CONSCIÊNCIA NO SUFISMO

Abaixo temos um resumo de uma palestra exposta em 2004 por Mohammad Ragip no Encontro da Nova Consciência, em Campina Grande, Paraíba. O Sheikh Mohammad Ragip é representante da Ordem Sufi Halveti Al-Jerrahi, com sede na Turquia, e é uma pessoa especialíssima. Serena e segura de si, como uma águia. Altivo, sem ser arrogante. Ele desarma qualquer pessoa que tenha preconceitos com o Islamismo, pois emana muita paz e autoridade. Ele é praticamente a cara e o jeito do Saladino (como retratado no filme Cruzada), interpretado por Ghassan Massoud (foto ao lado). Ragip é brasileiro, não tem origem árabe, mas se converteu ao islamismo há 10 anos. Atualmente é responsável por uma Tekkia, local onde os Dervixes (os praticantes do sufismo) se reúnem para rezar e praticar seus rituais.

O que me deixou triste após a palestra foi perceber que uma doutrina tão delicada, tão ponderada, fique isolada em “ilhas de saber” por falta de divulgação (ou de interesse dos ocidentais pelo islamismo). O sufismo deveria ser o cartão de entrada do islamismo pro resto do mundo, pois é impossível não amolecer o coração diante da Verdade que irradia da doutrina. Vejamos:

O Sufi é mais prático do que teórico. Não interessa a ele o depois, e sim o agora. O Sufismo estuda o que devemos fazer para desenvolver nossa consciência aqui nesta existência. Por isso não acredita (ou ao menos não está incluída na doutrina) em reencarnação, pois esta seria uma teoria prejudicial ao que o sufismo se propõe.

O coração, no Sufismo, é o centro do ser espiritual, e não um aspecto emocional (como no ocidente). É equivalente a um espaço no corpo, onde a alma (espírito) disputa esse espaço com o ego (Nafs, que em árabe significa alma animal). Este ego é uma parte material da sua existência, e não a consciência em si.

Existem 7 níveis de consciência dentro da doutrina Sufi. Entretanto, esta divisão está mais para um imenso degradê, existindo assim diversos subníveis. O menos evoluído dos níveis é o que veremos primeiramente:

1 – Nafs ammara (O Eu que induz ao mal)
A maior parte da humanidade está neste nível. Desconectada do resto do mundo, onde busca apenas a satisfação de seus desejos. Nos níveis mais elevados de Nafs ammara o mal está na mentira (tanto pra satisfazer ao ego, como pra levar vantagens), na fraude, na sonegação do imposto de renda, enfim, nesses “pequenos” defeitos que são justificados por nossa mente. Nos níveis mais baixos encontramos os assassinos, estupradores, assaltantes, etc.

Para sair desta roda de sofrimento você precisa estar apto a receber a misericórdia de Deus, e para isso você precisa se ver de fora, ter algo como um “grilo falante” que lhe diga que isto não é correto, por mais “benefícios” aparentes que lhe traga. É acender a centelha divina que está dentro de todo mundo. Podemos receber esse “empurrãozinho” Divino (pra que possamos nos aperfeiçoar) quando, por exemplo, sentimos um gratificante bem-estar ao se fazer alguma coisa boa a alguém. Mas isso é só a ponta do iceberg, que a pessoa deve descobrir por ela mesma, sem “recompensas”.

Enfim, no Nafs ammara não há consciência de certo ou errado, bem ou mal, no seu sentido mais universal. Apenas no fim deste nível é que há a percepção.

2 – Nafs lawwama (O Eu acusador)
A consciência interior do certo e do errado. A pessoa nesse nível assume como verdade interior o que aprendeu — seja através de tradições (familiares, ou de um grupo) ou religiões. O problema aqui é esse “censor” interno ser tão rigoroso que possa levar a pessoa à depressão, ou a julgamentos muito rigorosos consigo mesmo. O que normalmente surge desse encontro consigo mesmo é o remorso, e é preciso ter muito cuidado pra não desmoronar de vez ao ver-se como realmente é. Outros, pra poder se “sustentar”, preferem voltar o “Eu acusador” para os outros, e não pra ele mesmo. Então essa pessoa passa a ser uma perseguidora, uma inquisidora, se achando uma defensora do “certo”, da Verdade. É uma fachada (a tal sombra de Jung) pra um problema que está dentro dela mesma. Se ela não se perdoar primeiro, se não compatibilizar o pensamento de outrora com o de hoje, não perdoará aos outros.

3 – Nafs mulhima (O Eu inspirado)
O conjunto ética/ação é o que caracteriza a pessoa nesse nível. O indivíduo passa a ter mais sonhos e visões, e a achar que coisas que não são válidas para os outros podem ser válidas pra ele. O risco nesse nível é a pessoa confundir paixão com inspiração, porque o coração ainda está dominado pelo ego. Pessoas em Nafs mulhima podem tornar-se líderes religiosos e, mesmo com a melhor das intenções, podem achar que “inventaram” ou descobriram um novo caminho pra Deus, que são enviados do Alto para a humanidade, e podem assim acabar inflando ainda mais o próprio ego, por se acharem os donos da verdade.

Do terceiro nível para cima é recomendável o acompanhamento por uma escola mística, um grupo, um apoio espiritual de quem já tenha trilhado esse caminho. Isso porque há sempre o risco do ego assumir um comando ainda maior do coração. O Mestre é um guia, que nos mostra os passos para que seja possível obter as experiência necessárias para o caminho sem tropeços. Mas é preciso que os passos sejam válidos para todos, éticos, públicos e transparentes.

4 – Nafs mutmaina (O Eu tranqüilo)
Neste nível a pessoa já aquietou o ego, e possui um bem-estar interior mais constante. Já começa a vislumbrar um efeito de integração entre todas as coisas.

5 – Nafs radiya (O Eu que está satisfeito com Allah)
Neste nível a pessoa está liberta da influência do ego no coração. A partir daí não há possibilidade de regressão. Ele olha o mundo e consegue compreendê-lo como um sistema perfeito, sem falhas. Mas isso não significa que essa pessoa não tenha falhas, que não fique triste nem condoída com o problema dos outros. Não há arrogância.

Se tal pessoa não morrer neste nível de consciência, fatalmente atingirá o próximo.

6 – Rafs mardiya (Aquele com quem Allah está satisfeito)
São os considerados “amigos de Allah”. Jesus, além de ser considerado (pelos muçulmanos) um profeta para o povo hebreu, é também um “amigo de Allah”. Bonito, não?

7 – Nafs saffiya (O Eu perfeito)
O momento em que o ego se dissolve na consciência divina, no qual, simbolicamente, amado e amante se confundem.


Allah desperta em cada um de nós uma paixão por algo, para que seja desempenhada com amor, em benefício ao próximo. Cabe a nós descobrir esse dom e dar o máximo de nós mesmos para unir em nossas ações o amor.

Referência:
Chat com o Sheik Ragip;
Entrevista com o Sheik Ragip;
Livro “The Sufi path of knowledge” (A história dos Dervixes);
The message (Filme com a história do islamismo)

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Marcelo
Marcelo
30 agosto de 2007 6:42 pm

Olim, eu sempre procuro também descobrir qual é o meu talento especial para mudar o mundo. Esse é exatamente o 3o nível. A gente começa a achar q tem q ter algo de especial para fazer alguma coisa pelo mundo. Isso nada mais é do que ego. Vamos parar para pensar. Qual era o talento de buda? Qual era o talento de jesus? Qual era o talento de gandhi? Nenhum deles tinha talentos especiais. Então esqueça essa estória de dom. isso só nos deixa parados. Qnd começarmos a nos mover, os dons aparecerão naturalmente e nós nem nos daremos conta… Read more »

Simorg
Simorg
30 agosto de 2007 1:12 am

Muito bom o texto.
Recomendo a leitura do livro: A Linguagem dos Pássaros de Farid ud-Din Attar.

E só ressaltando as palavras do autor do texto…:

“Sufismo deveria ser o cartão de entrada do islamismo pro resto do mundo, pois é impossível não amolecer o coração diante da Verdade que irradia da doutrina.”

Muito bom!

Olim
Olim
30 agosto de 2007 9:29 am

Nunca tinha lido algo a respeito deste tema… Gostei muito! Por outro lado me pergunto até quando cessará a busca por melhores paisagens, por caminhos mais diretos, objetivos e certeiros? Estamos sempre nos pré-ocupando em obter a fórmula ideal, o método certeiro, o melhor caminho… A natureza é realmente primorosa, rica e encantadora e temos incutida em nossa mente a inércia de criarmos marcos de referência quando trilhamos nela, para que ao adentrarmos sua riqueza não nos percamos pelo encantamento(ou não) que nos afeta, para assim melhor retornarmos ao ponto de origem, caso não cheguemos à terra prometida. Acho que… Read more »

L34ndr0
L34ndr0
30 agosto de 2007 9:38 am

realmente impressionante como algo tão belo pode ser ignorado pelos ocidentais … seria algo politico?

Eduardo do Porto
Eduardo do Porto
30 agosto de 2007 9:54 am

A respeito do último comentário, penso que não esta em causa a parte espiritual. O grande problema dos ocidentais é o confronto com o Islão politico. Sou um acerrimo defensor do Estado laico e da separação dos poderes. Quem tiver dúvias sobre este meu ponto de vista pode ler um bom manual de história (ler sobre a reforma, contra-reforma e revolução francesa). O que se passa é que o Islão politico é muito mais “barulhento” que o sufismo, passando este último a estar muito mais “apagado” dos média.

Bindi
Bindi
30 agosto de 2007 9:59 am
nando
nando
30 agosto de 2007 11:19 am

Concordo com vc, Acid. Ultimamente tenho adquirido alguns livros sufis e é impressionante a profundidade e sabedoria, e o paralelismo com conceitos que a gente vem “importando” do oriente – Índia e Tibete, principalmente. Algumas vezes os ensinamentos e as práticas são muito parecidas com o Budismo Tibetano e o Vedanta Hindu.

Dois nomes que conheci e admiro mto: Pir Vilayat Inayat Khan e Meher Baba.

Belo post.

abs!

Loko
Loko
30 agosto de 2007 12:07 pm

Ola a todos, ae, esses dias fiquei até meio intrigado, tem um mendigo, q esta dormindo perto do apartamento ond moro, e tem feito muito frio esses dias, aí pensei, vo leva essa blusa pro cara neh, esse frio do caramba q ta fazendo deve ser dificil de encarar, qdo cheguei la, e fui entregar a blusa pra ele, ele naum quis de jeito nenhum, até insisti, falei pra ele, po cara, ta mó frio, só que mesmo assim ele naum quis, aí voltei pra casa com a blusa neh, e fiquei pensando, acho q tantas pessoas ja devem ter… Read more »

Olim
Olim
31 agosto de 2007 9:49 am

Marcelo e Acid:

MUITO OBRIGADO pelas dicas, de todo coração…!

💡

Djinn
Djinn
31 agosto de 2007 1:12 pm

Como pode um povo desses ter uma religião tão pacificadora?

Simorg
Simorg
1 setembro de 2007 2:49 pm

http://www.sufinaqsh.com

Site da Ordem Sufi Naqshbandi no Brasil

Eduardo do Porto
Eduardo do Porto
3 setembro de 2007 8:34 am

Hmm… Alguém por aqui já leu o Al-Corão?…

paulo d´andréa
paulo d´andréa
30 agosto de 2007 1:10 am

muito bom isso, as coisas realmente estão muito ligadas, enm quantas coisas que tem teorias de processo de iluminação não tem processos parecidos??

ja leram sobre os 7 vales(sufi tb)?
esse é intrigante tb!

Derkian
Derkian
29 agosto de 2007 11:56 pm

Interessante que para se estar pelo menos na metade do nível tem se que ter uma transformação gigantesca.

Excelente o texto!

Loko
Loko
30 agosto de 2007 2:01 pm

Concordo com a rosana

alan
alan
30 agosto de 2007 6:39 pm

so obrigado mais uma vez por abrir nossos olhos para coisas tao engrandecedoras

Avila
Avila
30 agosto de 2007 8:21 pm

Interessante este post… nós devemos muito à cultura islâmica!

daniel
daniel
30 agosto de 2007 5:51 pm

entendi
😉

Saindo da Matrix
Saindo da Matrix
30 agosto de 2007 5:22 pm

Que legal! Até o Genoíno lê o meu blog! Você melhor do que ninguém sabe que vão ser mal geridos, mesmo, é verdade. Só não diga uma coisa dessas na CPI ou você complica o sapo barbudo.

Olim, dom é dom, a gente não fica racionalizando isso 🙂
Quando percebe, já está fazendo, e, por ter amor envolvido, acaba saindo melhor do que a média. Mas o reconhecimento nem sempre vem de imediato. O dom de Renoir e Van Gogh era pintar, mas isso envolveu muita disciplina e treinamento. E nenhum incentivo ou reconhecimento, no caso do último.

José (PT)
José (PT)
30 agosto de 2007 3:54 pm

Eu continuo a ser da opinião que fugir aos impostos não é um mal, quando sabemos que esses impostos vão ser mal geridos.
Nem os meus conhecimentos espíritas me conseguirem convencer do contrário. Eu trabalho muito e tenho que saber gerir as minhas contas, tal como deviam saber fazer os governos. Sorry…

Olim
Olim
30 agosto de 2007 4:14 pm

Fugir do imposto, de forma legal(elisão fiscal) não é um crime, mas sonegar(sonegação fiscal, evasão) sim. Uma coisa é vc antecipando-se aos fatos quer geram tributos tentá-los reduzi-los ou até não recolhê-los. Outra coisa bem distinta é vc de má fé, de forma ganaciosa, egoística… não participar do fardo comum de uma sociedade, de modo que vc enriqueça mais do que as outras que contribuem. Acid: O final do teu post, última frase é o meu atual dilema, aliás um “atual” de quase 5 anos ou mais… É sobre o dom. Realmente creio que cad um de nós possui uma,… Read more »

Saindo da Matrix
Saindo da Matrix
30 agosto de 2007 3:26 pm

Rosana, não só pensei a respeito como inquiri o Sheik a respeito da questão. Ele me desarmou dando uma aula sobre os costumes islâmicos, que eu (e, com certeza, você, Rosana) desconhecemos e ns danamos a falar por conta do que vemos na TV. A mulher tem seus direitos, sim, dentro da visão cultural de um povo que vivia em TRIBOS NO DESERTO. Claro que existem países de cultura muçulmana que têm, por TRADIÇÃO, seus próprios costumes que se misturam com intepretações próprias do islamismo. Não dá pra confundir Al-Quaeda com Islamismo (é exatamente o que Bush quer). Dia desses… Read more »

daniel
daniel
30 agosto de 2007 3:08 pm

vem ca, quem q escreve todos esses posts? só uma pessoa? ou sao varias?

Mcnaught
Mcnaught
30 agosto de 2007 2:39 pm

Loko. Vc esta queimando seus neuronios em busca do: “Por que ele não aceitou´´ E isso pode ter inúmeras respostas. Mas, eu acho que quando o ser humano atinge o auge da depressão e sente-se totalmente incapaz. Ele se entrega totalmente a dor e sofrimento. Daí vem coisas como Karma, reencarnação, etc… para querer explicar. Mas, tomar uma atitude real e imediata, quase ninguém toma. Para ajudá-lo, acredito que só entrando na mente dele. Muitas vezes nem dá tempo.

Olim
Olim
30 agosto de 2007 2:45 pm

Hummmmmm…

Sera que lá eles aceitam as sogrinhas daqui?

Mas, tirando a brincadeirinha da sogra, acho que a estão misturando o Islã com a cultura do povo, é como comparássemos o Bush e seu discurso cristão.

Acho que não é por aí.

rosana
rosana
30 agosto de 2007 1:37 pm

Sim, é tudo muito bonito…na teoria!
Será que alguém já se deu conta de como as mulheres são tratadas nos países de cultura islâmica?
Que maravilha….

Anônimo
Anônimo
15 setembro de 2009 8:47 am

Fui copiar o titulo para salvar em txt e apareceu o seguinte: “OS 7 NÍVEIS DE CONSCIÊNCIA NO SUFISMO Versão pra garotas e Emos”

Vai entender o que se passa na cabeça de alguem para fazer uma “brincadeira” dessa. Talvez seja este o caso: não passe absolutamente nada.

O Sufismo tem um grande potencial. Vale a pena conhecer mais. Abraços.

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