Era uma vez um coelhinho que vivia numa cidade do interior, chamada Páscoa. Ele era muito inteligente e questionador, e quando foi visitar a capital viu, com profunda tristeza, que as pessoas gastavam todo o seu dinheiro com ovos de chocolate. Esses ovos eram símbolo de status, com seus papéis brilhantes e laços coloridos, e apesar de caríssimos quem não desse um de presente era malvisto pelos poderosos da cidade (os fazendeiros e donos de indústria) que compunham a nata da sociedade, então até mesmo os miseráveis se esforçavam para comprar pelo menos um ovo. Esse costume se espalhou pelas outras cidades, e logo virou um ritual comprar esses ovos.
O coelhinho era muito talentoso e descobriu, depois de algum tempo estudando e analisando esses ovos, como fazer um ele mesmo. E fez. Como não estava limitado pela hierarquia e estrutura de uma fábrica, ele pôde inclusive melhorar o sabor e baratear os custos de produção. Voltando à sua cidade, poderia montar sua própria fábrica de ovos e escoar toda a produção para o interior, mas como ele não era egoísta nem queria ver seu povo explorado, resolveu ensinar a todos como fazer seus próprios ovos de chocolate! Bastava apenas cada um da população dar 1 centavo e teriam chocolate para todos! A população da cidade achou isso uma idéia estapafúrdia, afinal, como poderia aquele coelhinho esquisito (que desde pequeno sempre foi tão questionador e arredio aos costumes da cidade) fazer um chocolate tão bom quanto o das fábricas? Então o coelhinho foi pra outra cidade, onde seria reconhecido pelo resultado do seu trabalho, e não pelo o que achavam dele.
Todos na cidade vizinha toparam dar um centavo: estavam com água na boca, e cheios de esperança de comer o chocolate. Então o coelhinho supervisionou toda a feitura (afinal, ele tinha o know-how) e dizia o quanto botar de cada ingrediente. O resultado é que o ovo de chocolate do coelhinho ficou mais delicioso que o das fábricas, e dava pra todo mundo comer até se fartar.
O coelhinho (agora chamado de “Coelhinho de Páscoa“) ganhou fama, e a notícia do ovo comunitário (agora chamado de “Ovo de Páscoa“) percorreu os povoados. Pra que comprar ovos caríssimos se podiam fazer eles mesmos, e ainda mais gostosos? A embalagem deixou de ter tanta importância, a não ser para os ricos, que sempre deram mais valor ao que se pode ver, mais do que sentir. Só que a notícia da fama também chegou aos fabricantes de ovos de chocolate na capital, que não gostaram nadinha disso. O que fizeram? Foram direto ao governador reclamar que, caindo as vendas dos ovos deles, diminuiria a arrecadação, gerando menos impo$tos, e as fábricas fechariam, gerando desemprego e consequente revolta com o governo. Era preciso preservar a ordem da nação. Então o governador pediu à polícia para intervir. Uma acusação contra o coelhinho foi imputada: quebra de patentes. Ninguém poderia questionar, pois a fórmula dos ovos de chocolate havia sido registrada pelas fábricas muitos anos antes, e não importava se o chocolate e a forma do ovo foram criados pela natureza: as fábricas eram as donas de tudo.
Enquanto isso o coelhinho tranquilamente ia de cidade em cidade ensinando que as pessoas deviam se unir pra fazer o ovo de chocolate. O interessante é que elas se interessavam em comer o ovo, mas não se interessavam em decorar a fórmula, nem em FAZER o ovo. Somente o coelho e seus ajudantes dominavam a arte, por mais que eles estivessem interessados em passá-la adiante.
Isso era ótimo para a indústria. Bastava eliminar o coelho pra, em pouco tempo, essa história de “ovo comunitário” virar uma lenda. Então a polícia prendeu o coelhinho. Alguns dos que o ajudavam conseguiram fugir, então a polícia resolveu fazer do coelho um exemplo: sentou o pau em cima dele, pra coibir qualquer tentativa de alguém querer repetir o que ele fez.
O coelho morreu na cela, com escoriações múltiplas. O delegado da polícia depois se eximiu da culpa: “Deve ter sido um ajuste de contas entre ele e a população local. Soube que parte do povo estava revoltada, pois o chocolate que ele fez provocou diarreia em muita gente. Tentamos protegê-lo numa cela individual, mas você sabe, esse povo ignorante só resolve suas desavenças com morte, então invadiram a delegacia e deu nisso…”
O médico legista (simpatizante do recém-fundado movimento underground chocolate caseiro), ao retirar o pano que cobria o cadáver, notou que o rosto do coelho, banhado em sangue, havia deixado seu contorno impresso no tecido. Logo a marca virou um ícone de protesto contra o monopólio do chocolate. As poucas pessoas que faziam seu próprio chocolate a utilizavam em camisetas, relógios, anéis… Até que virou uma sociedade secreta, e o símbolo virou uma coisa sagrada e cheia de significados esotéricos, a ponto das sucessivas gerações nem saberem mais o que aquilo significava originalmente. Até que um dia o símbolo foi ressuscitado pela indústria do chocolate (sim, a mesma que mandou matar o coelho) juntamente com o nome de Páscoa para alavancar as vendas de seus ovos, e utilizaram o seguinte slogan “Experimente os ovos do coelhinho de Páscoa, detentor da fórmula secreta(!) para fabricar o MELHOR chocolate do mundo!“. A ironia é que a fórmula é a mesma da indústria que mandou matar o coelhinho. A marca vendeu tanto, e se tornou tão popular que após isto o coelhinho virou mascote da indústria que mandou matá-lo, manteve a mesma velha fórmula e roubou pra si o nome “Ovos de Páscoa“.
E os donos da Indústria de Chocolate viveram felizes para sempre…
Pow essa de aprenderem a fazer a fazer seu próprio chocolate foi demais. Se eu tiver feito a analogia correta então O Coelho tentava realmente ensinar como desapegando-se do seu ego as pessoas tomariam posse de verdadeiro ego( interior subjetivo e inconsciente-dormente-latente) e aqueles que renunciassem a si mesmos “fariam as coisas que faço e ainda maiores”?